TÍTULO IV
Das Terras Indígenas
CAPÍTULO I
Disposições gerais
Art. 45. São reconhecidos às comunidades indígenas os direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam, competindo à União demarcá-las, protegê-las e fazer respeitá-las.
Art. 46. São terras indígenas:
I – as terras tradicionalmente ocupadas pelos índios;
II – as terras reservadas pela União, destinadas à posse e à ocupação pelos índios.
Art. 47. As terras tradicionalmente ocupadas pelos índios e as que lhes forem reservadas são bens da União, inalienáveis e indisponíveis, e destinam-se à sua posse permanente, não podendo ser objeto de quaisquer atos que restrinjam o pleno exercício da posse pelos próprios índios.
Parágrafo único. Aplica-se às terras indígenas destinadas à posse permanente e usufruto exclusivo das comunidades indígenas o disposto neste artigo e, no que couber, as ações do órgão federal indigenista definidas nesta lei para a proteção e regularização fundiária das terras tradicionalmente ocupadas ou reservadas.
CAPÍTULO II
Da demarcação das terras indígenas
Art. 48. As terras indígenas serão administrativamente demarcadas por iniciativa e sob a orientação do órgão federal indigenista, de acordo com o disposto nesta Lei.
Art. 49. A demarcação das terras tradicionalmente ocupadas pelos índios será fundamentada em trabalhos desenvolvidos por grupo técnico, coordenado por antropólogo, que procederá, em prazo fixado na portaria de nomeação baixada pelo titular do órgão federal indigenista, aos estudos de natureza etno-histórica, sociológica, jurídica, cartográfica, ambiental e ao levantamento fundiário necessários à delimitação.
§ 1º. O grupo técnico especializado, designado pelo órgão federal indigenista, será composto preferencialmente por servidores do próprio quadro funcional, com a finalidade de realizar os estudos previstos neste artigo.
§ 2º. O levantamento fundiário será realizado, quando necessário, conjuntamente com o órgão federal ou estadual específico, cujos técnicos serão designados no prazo de vinte dias contado da data do recebimento da solicitação do órgão federal indigenista.
§ 3º. O grupo indígena envolvido, representado segundo suas formas próprias, participará do procedimento em todas as suas fases.
§ 4º. O grupo técnico solicitará, quando for o caso, a colaboração de membros da comunidade científica ou de outros órgãos públicos para embasar os estudos de que trata este artigo.
§ 5º. No prazo de trinta dias contado da data da publicação do ato que constituir o grupo técnico, os órgãos públicos devem, no âmbito de suas competências e às entidades civis é facultado, prestar-lhe informações sobre a área objeto da identificação.
§ 6º. Todos os membros do grupo deverão ter, sempre que possível, conhecimento específico sobre a comunidade indígena e a terra por ela ocupada.
§ 7º. Por solicitação do Presidente do órgão federal indigenista, a Polícia Federal deverá designar agentes para garantir segurança aos trabalhos do grupo técnico.
§ 8º. Os trabalhos do grupo técnico e os demais atos previstos nesta lei terão seu início e conclusão e o nome dos encarregados e responsáveis, publicados no Diário Oficial da União, garantido o acesso permanente e gratuito a todas as informações relativas ao procedimento demarcatório às comunidades indígenas, às suas organizações e aos demais interessados.
Art. 50. Concluídos os trabalhos de identificação e delimitação, o grupo técnico apresentará relatório circunstanciado ao órgão federal indigenista, caracterizando a terra indígena a ser demarcada.
§ 1º. O grupo técnico submeterá à anuência da comunidade indígena ocupante da terra objeto da identificação a proposta circunstanciada e fundamentada de limites a serem demarcados.
§ 2º. Aprovado o relatório pelo titular do órgão federal indigenista, este fará publicar, no prazo de quinze dias contados da data que o receber, resumo do mesmo no Diário Oficial da União e no Diário Oficial da unidade federada onde se localizar a área sob demarcação, acompanhado de memorial descritivo e mapa da área e encaminhará cópia da publicação ao fórum da sede da comarca ou à Prefeitura Municipal da situação do imóvel, solicitando sua afixação em local apropriado na sua sede.
§ 3º. Se considerar incompleto o relatório, o Presidente do órgão federal indigenista, em dez dias, determinará a complementação do trabalho, que deverá ser concluída no prazo de sessenta dias.
§ 4º. Desde o início do procedimento demarcatório até noventa dias após a publicação de que trata o § 2º deste artigo, poderão os Estados e Municípios em que se localize a área sob demarcação e demais interessados manifestar-se, apresentando ao órgão federal indigenista razões instruídas com todas as provas pertinentes, tais como títulos dominiais, laudos periciais, pareceres, declarações de testemunhas, fotografias e mapas, para o fim de pleitear indenização ou para demonstrar vícios, totais ou parciais, do relatório de que trata o parágrafo anterior.
§ 5º. Nos sessenta dias subseqüentes ao encerramento do prazo de que trata o parágrafo anterior, o órgão federal indigenista encaminhará o respectivo procedimento ao Ministro de Estado da Justiça, juntamente com pareceres relativos às razões e provas apresentadas.
§ 6º. Em até trinta dias após o recebimento do procedimento, o Ministro de Estado da Justiça decidirá:
I – declarando, mediante portaria, os limites da terra indígena e determinando a sua demarcação;
II – prescrevendo todas as diligências que julgue necessárias, as quais deverão ser cumpridas no prazo de noventa dias;
III – desaprovando a identificação e retornando os autos ao órgão federal indigenista, mediante decisão fundamentada, circunscrita ao não atendimento do disposto no § 1º do art. 231 da Constituição e demais disposições pertinentes.
Art. 51. Verificada a presença de ocupantes não índios na área sob demarcação, o órgão fundiário federal dará prioridade ao respectivo reassentamento, segundo o levantamento efetuado pelo grupo técnico, observada a legislação pertinente, inadmitindo-se que seja causa para o retardamento do procedimento de demarcação da terra indígena.
Art. 52. O órgão federal indigenista assegurará aos terceiros ocupantes o pagamento de indenização por benfeitorias derivadas da ocupação de boa-fé.
Parágrafo único. Não se aplica o direito de retenção a terceiros ocupantes de terra indígena.
Art. 53. A comunidade indígena interessada ou o Ministério Público Federal podem requerer a instauração do procedimento demarcatório ao Presidente do órgão federal indigenista, que deverá faze-lo no prazo de trinta dias, contados a partir da data do protocolo do pedido.
Parágrafo único. Caso o pedido de abertura de instauração do procedimento demarcatório seja indeferido, o presidente do órgão federal indigenista apresentará as suas razões dentro do prazo estabelecido no caput desse artigo, devendo esta decisão ser publicada no Diário Oficial da União.
Art. 54. O requerimento de instauração previsto no artigo anterior deverá ser instruído mediante a apresentação dos seguintes documentos ao órgão federal indigenista:
I – elementos comprobatórios da terra por eles tradicionalmente ocupada através de laudo antropológico e étno-histórico;
II – mapa e memorial descritivo dos limites das terras por eles ocupadas tradicionalmente.
Art. 55. A demarcação física das terras indígenas será feita com base na descrição dos limites contidos no ato declaratório previsto no inciso I, do § 6º, do art. 50.
§ 1º. Concluídos os trabalhos de campo e encaminhado o competente relatório ao Presidente do órgão federal indigenista, este remeterá, no prazo de dez dias, os autos do procedimento demarcatório correspondente para sua homologação pelo Presidente da República.
§ 2º. A demarcação física das terras reservadas será feita com base na descrição dos limites contidos no ato do Poder Público que as houver estabelecido.
Art. 56. Após o ato declaratório da ocupação indígena previsto no inciso I, do § 6º, do art. 50, as comunidades indígenas poderão promover, com a supervisão do órgão federal indigenista, a demarcação física das terras conforme memorial descritivo.
Art. 57. A demarcação das terras indígenas, obedecido o procedimento administrativo previsto neste Capítulo, será homologada mediante decreto.
Art. 58. Em até trinta dias após a publicação do decreto de homologação, o órgão federal indigenista promoverá o respectivo registro em cartório imobiliário da comarca correspondente e na Secretaria do Patrimônio da União do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão, ou órgão que venha substituí-la.
Parágrafo único. Após o registro, o órgão federal indigenista enviará uma cópia do registro na Secretaria do Patrimônio da União e da matrícula do imóvel à comunidade indígena.
Estatuto do Índio