Amazônia: muita biodiversidade e pouco conhecimento

Nos últimos anos, observa-se no panorama intelectual da Amazônia e no Brasil, como um todo, o uso cada vez mais crescente de termos como, desenvolvimento sustentável, biodiversidade, ecodesenvolvimento, etc., que, sob formas diversas, apontam para a preocupação com o meio ambiente e, especialmente, para a relação do homem com o meio ambiente.

O Brasil, com uma extensão territorial de cerca de 8.500.000 km², tem aproximadamente 40% da sua área coberta por floresta nativa e possui a biodiversidade mais rica do mundo. Essa imensa riqueza natural constitui um verdadeiro patrimônio científico, tecnológico, econômico e cultural, que precisa ser conhecido, preservado e explorado racional e criteriosamente.

Paradoxalmente, essa biodiversidade valiosa e rica, maior reserva genética do mundo, é a menos conhecida e esse é o desafio: conhecê-la e preservá-la. Segundo estimativa do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico – CNPq (Avaliação e Perspectivas, v. 6, Botânica, p. 113-161. 1987) seriam necessários 360 botânicos de alto nível, trabalhando no mesmo ritmo e qualidade de Karl Von Martius, botânico alemão do século XIX, e seus colaboradores, durante 50 anos, para que esse patrimônio fosse, pelo menos, conhecido taxonomicamente, abordando apenas os vegetais superiores.

Os recursos naturais são de pouca utilidade se não forem racionalmente explorados. Essa é uma condição indispensável para promover sua conservação, perpetuando as boas qualidades do meio ambiente para as gerações futuras. Não se pode valorizar e preservar o que não se conhece.

Uma revolução de grande impacto que precisa ser feita pela ciência é dar maior atenção às pequenas e desconhecidas plantas e animais que fazem o resto do mundo funcionar. São pequenas criaturas – micróbios, vermes, fungos, besouros e aracnídeos – que revolvem a terra, processam restos de madeira e folhas, tiram nitrogênio do ar, reciclam nutrientes minerais, administram o ciclo da água, liberam dióxido de carbono, metano e outros gases nobres e servem de base para toda a vida no subsolo.

Florestas, savanas e terras para plantio se sustentam em grandes, extensas e desconhecidas cadeias de criaturas que vivem no primeiro metro de terra sob a superfície. O estudo de alguns desses organismos resultou em importantes antibióticos e na economia de bilhões em fertilizantes e pesticidas para os fazendeiros.

Essas criaturas podem gerar uma nova revolução agrícola e render incontáveis riquezas às indústrias do futuro. São os organismos menos estudados do planeta. Provavelmente, há maior diversidade biológica em um punhado de terra de jardim, do que plantas e animais nas florestas tropicais. Uma tonelada de terra pode conter milhões de espécies de bactéria. Só 4 mil foram classificadas. As 72 mil espécies de fungos conhecidas até agora representam apenas 5% do possível total.

Graças às pesquisas realizadas pela Embrapa, desde o início da década de 70, bactérias responsáveis pela filtragem de nitrogênio, espalhadas nas plantações de soja brasileiras, substituíram fertilizantes artificiais e resultaram numa economia de US$ 1 bilhão por ano para o País.

A Embrapa Acre tem contribuído para aumentar o conhecimento e o uso sustentável da biodiversidade amazônica com a geração de importantes tecnologias cujo objetivo é reduzir a pressão sobre os recursos florestais, destacando-se: técnicas de manejo de pastagens para a verticalização da pecuária, manejo florestal sustentável para produtos madeireiros e não-madeireiros, extração de safrol da pimenta longa, bioprospecção de plantas para uso medicinal e com potencial para a fabricação de defensivos naturais de uso agrícola, entre outras. Entretanto, apesar de relevantes, essas ações ainda são insuficientes diante do enorme desafio de “domar” a Amazônia. A Embrapa, as universidades e outras instituições de pesquisa poderiam fazer muito mais, se fossem alocados os recursos financeiros e humanos necessários para essa grande empreitada, seja por parte do governo ou da iniciativa privada, cujos investimentos em pesquisa ainda são incipientes.

O economista e ativista ambiental Lester R. Brown recomenda que os brasileiros lutem pela preservação da Amazônia “porque é algo muito valioso para o Brasil, se o País souber preservá-la. Quando vejo as queimadas de florestas na Amazônia e a perda permanente e irreversível de material genético que só existe naquela área, isso me faz lembrar do incêndio da biblioteca de Alexandria, mais de 2 mil anos atrás. Era uma biblioteca extraordinária, como nenhuma outra no mundo, e foi queimada. O que o Brasil tem é uma grande biblioteca biológica, com uma variedade de DNA que não existe em nenhum outro lugar no mundo, e está literalmente queimando isso, sem perceber quanto ela é valiosa”.

Portanto, é necessário um firme posicionamento por parte das autoridades e da comunidade científica na solução desses problemas, esforços para minimizar as deficiências e suprir as necessidades do sistema de ciência e tecnologia relacionado ao conhecimento e uso da biodiversidade, tornando possível ao Brasil igualar-se aos centros mundiais mais avançados. Só assim se fará jus ao patrimônio natural que se possui.

Elias Melo de Miranda, M.Sc., pesquisador da Embrapa Acre (elias@cpafac.embrapa.br)