Praia Local – Lixo Global

Meu nome é Fabiano Prado Barretto, tenho 32 anos, sou fotógrafo da cidade de Salvador da Bahia, Brasil. Durante o Carnaval 2001 fiz algumas caminhadas pelas praias da Linha Verde, Litoral Norte da Bahia (Costa dos Coqueiros). Caminhei aproximadamente 86 quilômetros em quatro dias. Andei pela praia os trechos entre Praia do Forte e Porto Sauípe (27 km), Porto Sauípe e Subaúma (12 km), Subaúma e Baixios (22 km) e Barra do Itariri e Sítio do Conde (25 km).

Para minha surpresa, havia uma grande quantidade de lixo nas praias, inclusive nos trechos entre uma praia e outra, entre as vilas, aonde a freqüência de público é quase zero. São trechos de praia praticamente intocáveis, semi-desertas. Caminhei as vezes 4, 5, 6 … 8 quilômetros sem ver ninguém, considerando que era um período de feriado prolongado, e a freqüência de banhistas nas praias cresce bastante.

No trecho entre as Piscinas Naturais do Papa Gente na Praia do Forte e a boca da barra do Rio Barroso na Praia de Imbassaí, coletei uma grande quantidade de embalagens, nomeadamente 81. No trecho entre as praias de Subaúma e Baixios recolhi outras 13. Todas as embalagens são de produtos estrangeiros.

Fiz a identificação e catalogação do lixo e constatei que as embalagens são de 26 diferentes países, sendo os Estados Unidos (10), África do Sul (9) e Alemanha (8) os mais representados nas praias baianas. Há lixo das mais variadas procedências, dos quatro cantos do planeta, como por exemplo:  Indonésia, Argentina, Canadá, Espanha, Índia, Finlândia, Tailândia, Coréia do Sul (Cheju Island, ilha localizada no Mar da China Oriental, entre o Estreito da Coréia e o Mar Amarelo) e Chipre. Das 94 embalagens coletadas, eu consegui identificar a origem de 88 delas. Não foi possível determinar a origem das demais, porque o rótulo estava ilegível, ou ausente de código de barras, ou ainda, por não entender o idioma.

As embalagens de produtos encontrados com maior frequência foram água mineral (21) e leite (13). Também havia inseticidas, sucos, produtos de beleza e limpeza, material de escritório, refrigerantes e alimentos diversos. O tipo de embalagem mais comum foram as plásticas (46) e os sprays em latas (21). Embalagens Tetra Pak também havia muitas (17).

Conclui-se que este lixo está sendo jogado no mar pelas embarcações estrangeiras, podendo ser desde veleiros particulares, até cargueiros e cruzeiros de turismo, chegando a costa trazido pelas correntes marítimas. Pela diversidade da origem das embalagens, ausência de indicação de importadores brasileiros nos rótulos e pelo local da coleta, fica comprovado que o lixo não foi jogado diretamente na praia por turistas estrangeiros. É inviável que turistas venham ao Brasil trazendo lâmpadas, leite, inseticida, entre outros produtos encontrados na praia.

Uma corrente marítima trouxe a maior parte (72 das 94 embalagens) do lixo para quatro quilômetros de praias, no meio da maior baía, entre a Praia do Forte e Imbassaí. Este trecho que totaliza dez quilômetros de praias, não possui nenhuma casa. O terreno pertence a Fundação Garcia D´Ávila, presidida pelo alemão Klaus Peter, proprietário do Eco Resort Praia do Forte.

Praia Local, Lixo Global 2002 O “G-7 do Lixo Global”  representa 56,5% do total das embalagens

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Ninguém sabe precisamente como o lixo globalizado resolveu se acomodar naquele pequeno trecho de praias. Para o meteorologista Ricardo de Camargo, especialista em correntes e ventos na costa brasileira, é um mistério, pois há navios que têm o mau hábito de lançar lixo no mar, mas em sacos plásticos que não deveriam se romper nem chegar à costa. “A explicação pode ser a incidência de ventos de leste, muito comuns naquela área”. diz o pesquisador da USP. O Giro Tropical, um conjunto de correntes, poderia estar trazendo os objetos lançados de qualquer navio que passasse pelo Atlântico, entre África e Brasil. Isto explica porque os detritos vêm para esses lados, mas não porque escolhem a prainha baiana.

Também foram encontrados 1.647 sinalizadores, para os quais não é possível a identificação da origem, pois nada têm escrito. Quarenta e três lâmpadas, incandescentes e fluorescentes, que pelo modelo (tipo de bocal e filamentos) são de fabricação estrangeira, e cinqüenta e quatro garrafas de vidro de bebidas alcóolicas.

Nos três primeiros meses deste ano, 343 navios estrangeiros cruzaram as águas baianas em direção aos portos de Salvador, Ilhéus e Porto Seguro, trazendo turistas e cargas, informou a Capitania dos Portos de Salvador. Alguns como o transatlântico italiano Rhapsody, com capacidade para 800 passageiros, atracaram em águas baianas, pelo menos uma vez por semana, durante o verão.

É proibido a qualquer embarcação jogar lixo no mar, mas a fiscalização dos navios, a cargo da Capitania dos Portos e da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) é complicada. Segundo Manuel Argolo da Cruz, chefe do departamento de segurança de tráfico aquaviário da Capitania dos Portos da Bahia, cerca de 35% das embarcações são abordadas por fiscais que verificam desde o estado do barco até o destino do lixo. “A maioria dos barcos não joga lixo no mar, mas muitos apresentam indícios de terem jogado”, diz, admitindo não conhecer nenhuma multa aplicada por isso. “É difícil provar”.

De acordo com a Marinha, o descarte de lixo na faixa de 200 milhas, que corresponde ao mar territorial brasileiro, é considerado crime passível de multa, que varia de R$ 7 mil a R$ 50 milhões. “Apesar do rigor da punição, um flagrante, nesses casos, é praticamente impossível”, justifica o capitão-de-fragata e comandante interino da Capitania dos Portos de Salvador, Sérgio Silveira. Para fiscalizar todos os 950 quilômetros do litoral da Bahia, a Marinha dispõe apenas de nove embarcações e um efetivo de 50 homens. “O descarte de lixo em alto mar é um crime comum no litoral do Brasil”, diz a ambientalista do Greenpeace, Viviane Silva.

Segundo a oceanógrafa Ceci Moreira de Souza, do Instituto Oceanográfico da USP – Universidade de São Paulo (Brasil), essas embalagens provêem certamente de embarcações que passam próximas a costa. “A possibilidade do material ter sido trazido de locais distantes como a Europa, por correntes marítimas, é praticamente nula”, afirma ela.

Com um litoral gigantesco, o descarte de lixo em águas brasileiras, tanto por parte dos passageiros quanto por parte da tripulação, pode ser consumado a qualquer hora do dia ou da noite, sem testemunhas. Por lei, toda embarcação deve manter, sempre à vista, recipientes para coletar o resíduo produzido a bordo. As normas são regidas por The International Convention for Preservation of Pollution from Ships, uma espécie de bíblia da navegação internacional na área ecológica, em vigor desde 1973, e conhecida no país como Marpol. “Este tipo de crime só acontece porque o país não tem o respeito da comunidade internacional”, acredita o ambientalista Juca Ferreira, vice-presidente da Fundação Onda Azul e vereador de Salvador pelo PV – Partido Verde. Segundo ele, o Brasil precisa modernizar o conceito público de gestão econômica do seu território marinho, que se estende numa faixa de 200 milhas náuticas ao longo do litoral.

“Até agora o país só discutiu a questão do ponto de vista financeiro. Enquanto isso, nos tornamos quintal das grandes potências”, afirma Juca Ferreira. Nos Estados Unidos, a guarda costeira pune até com cadeia os comandantes dos navios que sujam a costa americana. Em todos os portos do país, principalmente onde o fluxo turístico é maior, são distribuídos folhetos e material educativo sobre a importância de se preservar os mares. As campanhas contam com o apoio de voluntários e da sociedade organizada.

Esse lixo pode representar uma ameaça à fauna local. “Os plásticos e vidros são perigosos sobretudo para os mamíferos marinhos e tartarugas”, explica o biólogo Gustavo Lopez, coordenador técnico na Bahia do Projeto Tamar, para reprodução das tartarugas marinhas. Lopez, lembra um vídeo que mostra uma tartaruga com dificuldades para desovar porque sua cloaca estava obstruída por um saco plástico, “que são engolidos com frequência pelos animais porque os confundem com algas”.

Pelos dados do Projeto MAMA – Mamíferos Marinhos, somente no ano de 2000, quatro golfinhos apareceram mortos em praias do litoral de Salvador, vítimas da ingestão de plásticos. Os animais, que têm a visão pouco apurada, costumam confundir este tipo de lixo com sua presa predileta, a lula. No caso mais grave, registrado na praia do Canta Galo (Cidade Baixa de Salvador), em 1998, um golfinho adulto foi achado morto, sem sinais de ferimentos. Na autópsia, os veterinários encontraram no estômago do bicho um pacote de arroz parbolizado da marca Uncle Bens, de fabricação norte americana. Ainda no ano 2000, mais um animal foi vítima da poluição marinha, dessa vez um filhote de baleia, da espécie Jubarte. O cetáceo, de aproximadamente um ano de vida, havia ingerido três tampinhas de garrafa pet, que ficaram presas na garganta retendo a passagem do leite. “O animal acabou morrendo de inanição”, diz Luciano Wagner, coordenador do projeto. Desta vez contudo, a sujeira era de origem brasileira.

Na qualidade de amante profundo do mar e freqüentador assíduo das praias do litoral baiano, do Brasil e do mundo, pois meus hobbys preferidos são o surf, o mergulho, a remada (travessia) com pranchões entre 9 e 15 pés e as caminhadas em praia desertas, e fazendo uso quase que integral do meu tempo de lazer na infância, adolescência e juventude nas praias, e nos últimos 12 anos trabalhando profissionalmente em eventos de surf (Uniclubes e ABRASP), achei neste fato lamentável, a oportunidade de retribuir ao oceano, tudo de maravilhoso que ele me deu, e continua dando. Firmei um compromisso pessoal de divulgar este fato, além do Brasil é claro, pelo menos nos três países com embalagens mais representadas nas areias das praias baianas, Estados Unidos, África do Sul e Alemanha, e em outros pelos quais eu passar ou tiver a oportunidade de divulgar. Como fotógrafo escolhi fazer isto através de exposições fotográficas e publicações na mídia. Batizei o fato de “Praia  Local, Lixo Global”.

“Este estudo, é o primeiro que se tem conhecimento na Bahia relacionado à origem do lixo que chega às praias, trazidos através dos movimentos das marés” (Revista Travessia, abril de 2001).

Primeiramente divulguei no meu estado (Março de 2001), na revista Travessia e nos jornais A Tarde e Correio da Bahia. Logo em seguida fui para São Paulo, aonde a matéria foi publicada no jornal Estado de São Paulo, nas revistas de circulação nacional Trip, Terra, Galileu, Náutica, Horizonte Geográfico e Eco Turismo Especial e nos Websites Waves, Família Aventura, Remada e Intersurf. De volta a Bahia foi produzida uma matéria com a TV Bahia, no local em que o lixo foi recolhido. A matéria foi exibida no Jornal Nacional da Rede Globo (Abril de 2001). Em setembro de 2001, foi publicada no informativo do Instituto Ecológico Aqualung, na edição sobre o Dia Mundial de Limpeza do Litoral e em outubro na revista Mergulho. Em outubro (2001) na revista Fluir e no site Recicláveis. Em março de 2002 no site iBahia.com.

Em março de 2002 foi produzido com a TV Educativa/IRDEB – Instituto de Rádio Difusão da Bahia, uma matéria que vai integrar o documentário sobre a APA-Área de Proteção Ambiental Litoral Norte, de uma série de todas as APA’s do Estado da Bahia. Está iniciativa é do CRA-Centro de Recursos Ambientais da Bahia.

De passagem em Portugal (Abril de 2001), a caminho da Alemanha, consegui as publicações na revista semanal Visão e no jornal Diário de Notícias, ambos de circulação nacional. Em março de 2002 foi publicada na revista Surf Portugal.

Na Alemanha, aonde estou morando atualmente, nos jornais Der Tagesspiegel (Berlin) e Hamburger Abendblatt (Hamburgo), na revista científica do ZMK (Centro para Pesquisas do Mar e do Clima) da Universidade de Hamburgo, na Greenpeace Magazin e na revista Mare. Em fevereiro de 2002 na revista Do Brasil.

Também na Alemanha aconteceu a primeira exposição fotográfica (2.7.01 a 20.7.01), na Humboldt-Universität zu Berlin. Em seguida (4.10.01 a 26.10.01) na Universidade de Hamburgo, (1.11.01 a 14.12.01) no Umweltbundesamt (Ministério do Meio Ambiente) em Berlin e (24.4.02 a 17.05.02) no Lateinamerika-Institut da Universidade Livre de Berlin. Para as exposições o título adotado é “Praia Local, Lixo Global… e isto é apenas o que flutua”. O título foi sugerido por Kerry Paul, patrocinador das ampliações das fotografias. Este título foi escolhido porque nem tudo que é jogado no mar pelos navios chega nas praias, a exemplo das garrafas de vidro, que muitas vezes enchem-se de água salgada e afundam. Têm ainda os líquidos químicos e as embalagens que são engolidas pelos animais. Para as exposições na Alemanha estou contando com o apoio da Embaixada do Brasil na Alemanha, do ICBRA – Instituto de Cultura Brasileira na Alemanha e do Fachlabor Jacobs+Schulz.

Estou viabilizando recursos para a impressão de cartazes para serem distribuídos mundialmente em portos, cruzeiros de turismo, companhias de transporte marítimo, navios cargueiros e de marinha, embarcações particulares, marinas e iates clubes. Serão impressos dois cartazes, cada um com 7 idiomas. Um será destinado a Europa Ocidental, África do Sul, Oceânia, América do Sul, Central e do Norte. Este será nos idiomas inglês, português, alemão, espanhol, francês, italiano e grego. O outro cartaz será destinado a Europa Oriental, norte da África e Ásia. Inglês, Russo, Chinês, Japonês, Árabe, Coreano e Turco serão os idomas. Inicialmente serão impressos 5 mil cartazes para cada destino. As traduções dos idiomas foram feitas pelos interpretes da aiic- Associação Internacional dos Interpretes de Conferência.

Leonardo Villanova, publicitário, diretor do Clube de Criação da Bahia e Gerente de Criação da Ilimit (empresa de Internet da Rede Bahia de Comunicação), que desenvolveu o layout dos cartazes, também criou um logotipo de sinalização de combate a poluição marinha. Estou viabilizando recursos para a impressão de 50 mil adesivos deste logotipo para serem distribuídos mundialmente junto com os cartazes.

Além do cartaz e do logo, Leonardo Villanova criou o site do lixo global. O site está disponível em português, inglês e alemão no endereço www.globalgarbage.org

Em 2004 a ação Praia Local, Lixo Global chegará nas escolas privadas e públicas de Salvador, Lauro de Freitas e Camaçari. Praia Local, Lixo Global ficará de segunda a sexta-feira em cada escola, com fotografias, publicações, lixo global, televisão com exibição das matérias (Jornal Nacional e TV E) e computador para os estudantes navegarem no website do lixo global. Na quinta-feira será ministrada uma palestra e no sábado os estudantes vão as praias da Costa dos Coqueiros para fazer a coleta do lixo global. A equipe de coleta será formada por 40 estudantes, 2 professores de educação física, 2 guarda-vidas e 2 representantes da Praia Local, Lixo Global.

O objetivo é que a chegada do lixo na costa seja monitorada pelos estudantes, e os dados repassados a Capitânia dos Portos da Bahia. Foram escolhidos 4 trechos com maior ocorrência da chegada do lixo. Praia do Forte-Imbassaí, Imbassaí-Porto Sauípe, Porto Sauípe-Subaúma e Subaúma-Baixio. Desta forma cada trecho será monitorado mensalmente. Outros trechos da Costa dos Coqueiros serão monitorados trimestralmente.

Em fevereiro de 2002 andei com Davi Neves 68 km entre a Praia do Forte e a vila praiana de Baixio. Foram recolhidas 730 embalagens de 47 diferentes países. USA, Itália, Taiwan, África do Sul e Alemanha foram os cinco países mais representados com embalagenas nas praias da Costa dos Coqueiros. Embalagens plásticas de água mineral representou 38% das embalagens.

Foi encontrada uma carta dentro de uma garrafa de água mineral. A carta de um navegador italiano, que continha as coordenadas, foi jogada a 3.200 km da costa, em um ponto próximo a Ilha Santa Helena. Tanto a garrafa de água mineral, como o navegador brasileiro Amyr Klink, fizeram praticamente o mesmo percurso deste ponto até a Costa dos Coqueiros, quando Klink da sua travessia a remo da África para o Brasil, retratada no livro Cem dias entre céu e mar, que o navegador chegou na Praia da Espera, em Itacimirim, a 5 km sul da Praia do Forte. Amyr veio sempre beneficiado pelas correntes, assim como a garrafa.

Foi feita uma triste constatação. O lixo que fica na areia é soterrado pelo movimento da praia, tornando as paradisiacas praias do litoral norte baiano em um cemitério de embalagens industriais.

Espero que em breve os oceanos estejam livres do lixo.

A natureza agradece !

Os seres marinhos agradecem !

O oceano agradece !

A praia agradece !

Yemanjá agradece !

Nossos filhos agradecem !

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