Formular políticas para um Brasil sustentável significa introduzir uma nova dimensão ética na política. A ética ecológica é um padrão de comportamento que flui através da percepção de que todos pertencemos à comunidade global da biosfera. E nós devemos nos comportar como os outros seres vivos: as plantas, os animais e os microorganismos que formam esta vasta rede da vida, sem interferir com a capacidade surpreendente desta rede de sustentar a vida.
Uma comunidade sustentável é organizada de maneira a promover a vida, os negócios, a economia, a infra-estrutura e a tecnologia sem interferir com a herança da natureza de sustentação da vida. O primeiro passo deste desafio é entender o princípio da organização dos ecossistemas para sustentar a rede da vida. Quando estudamos os princípios básicos da ecologia, descobrimos que eles são os princípios de organização de todos os sistemas vivos. Todos os organismos vivos dependem de um fluxo contínuo de energia e matéria, e todos produzem lixo, mas o lixo de uma espécie é o alimento de outra. A energia que move os ciclos ecológicos flui do sol. A rede é o padrão básico de organização da vida. Desde o princípio, há mais de três bilhões de anos, a vida surgiu no planeta não através da competição, mas através da cooperação, de parcerias e da formação de redes. A natureza sustenta a vida criando e nutrindo as comunidades. Nenhum organismo sobrevive isolado.
Os animais dependem da fotossíntese das plantas, as plantas dependem do dióxido de carbono produzido pelos animais, bem como do nitrogênio fixado pelas bactérias e raízes, e juntos as plantas, animais e microorganismos regulam toda a biosfera e mantém as condições que mantém a vida.
A sustentabilidade não é uma propriedade individual, mas uma propriedade de uma rede inteira de relações. Ela sempre envolve toda a comunidade. Esta é a lição profunda que precisamos aprender da natureza.
O modo de sustentar a vida é construir e manter comunidades. As comunidades interagem entre si. A sustentabilidade é um processo dinâmico de evolução conjunta. Ela inclui o respeito à integridade cultural e ao direito básico de autodeterminação e auto-organização das comunidades. Isto significa que a sustentabilidade ecológica e a justiça econômica são interdependentes. São dois lados da mesma moeda.
O fato de a sustentabilidade ser uma propriedade de uma rede inteira de relações significa que a sustentabilidade do Brasil não pode ser implementada mudando apenas a política energética, ou os subsídios para a agricultura. Ela só pode acontecer se for implementada simultaneamente em diversas áreas.
A transversalidade é uma enorme tarefa, e só obteremos sucesso se realmente compreendermos o principal princípio da ecologia: a vida não surgiu no Planeta pela competição, mas através da cooperação, parcerias e formação de redes.
Pronunciamento de Fritjof Capra na abertura dos Diálogos para um Brasil Sustentável.
Fonte: Revista Eco 21, Ano XIII, Edição 82, Setembro 2003. (www.eco21.com.br)