Aproveitamento da Água de Chuva

A água de chuva é uma das formas de ocorrência de água na natureza e faz parte do processo de trocas do ciclo hidrológico. As chuvas são fundamentais para a recarga dos rios, dos aquíferos, para o desenvolvimento das espécies vegetais e também para carregar partículas de poeira e poluição existentes na atmosfera. A qualidade das águas pluviais pode variar em relação ao grau de poluição do ambiente. Os requisitos de qualidade e segurança sanitária das águas pluviais estão diretamente relacionados com o fim a que se destinam.

O aproveitamento da água de chuva caracteriza-se por ser um processo milenar, adotado por civilizações como Astecas, Maias e Incas. Tomaz (2003) relata que um dos registros mais antigos do aproveitamento da água de chuva data de 850 a.C., referindo-se as inscrições na Pedra Moabita, no Oriente Médio, onde o rei Mesha sugere a construção de reservatórios de água de chuva em cada residência. O autor faz referência ainda ao palácio de knossos na Ilha de Creta, onde há aproximadamente 2000 a.C., a água da chuva era aproveitada na descarga das bacias sanitárias.

Segundo Fendrich (2009) a tecnologia para o uso da água de chuva nas edificações é a soma das seguintes técnicas:

a) coletar a água que precipita no telhado;

b) eliminar a água do início da chuva (descarte inicial);

c) unidades de sedimentação, filtragem, tratamento e melhoria da qualidade da água;

d) armazenar a água da chuva em reservatórios;

e) abastecer os locais de uso;

f) drenar o excesso da água de chuva, em caso de chuvas intensas;

g) completar a falta de água em caso de estiagem prolongada. 

Em se tratando de sistemas de aproveitamento da água de chuva, a manutenção e higienização dos equipamentos componentes de tal sistema são fundamentais para a preservação da qualidade da água. Não obstante, ressalta-se que a superfície de coleta da água de chuva pode influenciar na qualidade da mesma, seja pelo material da superfície ou devido a substâncias presentes em tais superfícies, como: fezes de aves e roedores, artrópodes e outros animais mortos em decomposição, poeira, folhas e galhos de árvores, revestimento do telhado, fibras de amianto, resíduos de tintas, entre outros que ocasionam tanto a contaminação por compostos químicos quanto por agentes patogênicos.

 A Tabela a seguir mostra alguns critérios nacionais e internacionais sobre qualidade da água para fins não potáveis.

tabela 3

Outro fator de relevada significância diz respeito ao dimensionamento dos reservatórios de água de chuva. A NBR 15.527/07 sugere em seu Anexo A, alguns métodos para o dimensionamento do reservatório, entretanto, fica a critério do projetista a escolha do método que melhor se aplica a cada situação. Vale ressaltar a importância de uma análise holística dos fatores que envolvem o aproveitamento da água de chuva no dimensionamento do reservatório. Devem ser considerados os aspectos hidrológicos locais, o atendimento ao consumo, os aspectos sanitários e também a sustentabilidade hídrica da bacia hidrográfica. Armazenar grandes volumes de água de chuva nas edificações, por longos períodos de tempo, pode comprometer a segurança sanitária da água armazenada e, ainda interferir no processo do ciclo do uso da água na bacia hidrográfica.

A princípio, uma cisterna deve armazenar o máximo de água da chuva possível, portanto precisamos calcular qual é esse máximo e decidirmos se compensa ou não o investimento. Para começar esse cálculo, é necessário ter uma média da quantidade de chuva que costuma cair na região. Isso é possível conseguir em algum centro de pesquisa meteorológica. Em média, para a região da grande São Paulo, uma chuva “normal” é de 10mm a 20mm. Isso significa que você poderá coletar e armazenar de 10 a 20 litros por m² de telhado. Exemplo: seu telhado tem 25m², então poderá coletar de 250 a 500 litros de água de chuva. Sendo assim, será necessário ter uma cisterna de no mínimo 500 litros. Mas, essa informação ainda é pouca para decidirmos o tamanho da cisterna.

Estudando por outro lado, precisamos saber quanto será o consumo diário dessa água (água de chuva) na residência; quanto vai gastar em lavagens de pisos, irrigações e nas descargas. Exemplo: se a demanda for de +/- 200 litros por dia, e se chover todos os dias, precisará de uma cisterna de +/- 200 litros. Agora, se a chuva cai de dez em dez dias, teoricamente precisará de uma cisterna de 2.000 litros. Mas com seu telhado de 25m2 e os 20mm de chuva, você só vai captar os 500 litros de água da chuva. Portanto, teoricamente, segundo essas informações, não vai adiantar nada ter uma cisterna de 2.000 litros. Mas, haverá dias em que vai chover mais do que os 20mm, e haverá épocas que vai chover mais vezes durante os dez dias, assim como haverá épocas que chega a ficar mais de um mês sem chuva. Então, se tiver condições de ter uma cisterna de 2.000 litros ou ainda maior, será muito bom para armazenar o máximo de água das chuvas acima dos 20mm, das épocas com maior índice de chuvas e das raras chuvas que ultrapassam os 40mm, mas aí, os custos começam a ficar muito elevados, podendo não valer o investimento.

Um outro fator que influencia muito na hora da escolha da cisterna é o espaço disponível para a sua instalação. Em regra geral uma cisterna deve ser instalada enterrada com apenas a tampa de inspeção para fora, ou em caso de construir a cisterna em alvenaria, deve ficar pelo menos 50cm acima do nível do piso; isso é importante para evitar que entre bichos ou que escorra água contaminada para dentro da cisterna, como por exemplo urina de cães ou gatos. Além desses detalhes, temos que prestar muita atenção se existe na casa o espaço físico (no quintal, garagem ou jardim) para instalar a cisterna, e temos que contabilizar a mão de obra e os carretos para a retirada de terra, que normalmente dobram de volume quando cavoucada.

Destacam-se algumas recomendações de suma importância na implantação de sistemas de aproveitamento da água de chuva nas edificações:

a) a desinfecção da água de chuva armazenada antecipadamente ao uso;

b) a higienização frequente do reservatório de água de chuva;

c) a análise da concepção do método de dimensionamento, a fim de subsidiar a escolha mais adequada a cada situação, preferencialmente aqueles que contemplem a abordagem holística do aproveitamento da água de chuva contextualizada na sustentabilidade hídrica;

d) a construção de sistemas independentes para água de chuva e água potável a fim de evitar o risco de contaminação.

Em estudo comparativo, desenvolvido por Giacchini et al. (2009) entre alguns dos métodos de dimensionamento propostos na NBR 15.527/07, o método de Fendrich (2002) e o método da Lei 10.785/03 do Município de Curitiba, observou-se a existência de divergência entre os resultados obtidos para o volume do reservatório dimensionado através dos métodos citados. Tal divergência foi justificada em função da diferença da natureza conceptiva de cada um dos respectivos métodos. Os autores concluíram que a inclusão da análise de critérios sanitários, pode ser valiosa para o estudo do dimensionamento de reservatórios de sistemas de aproveitamento da água de chuva. A Tabela apresenta as principais características de cada método de dimensionamento supracitado.

Tabela 4 - Características dos métodos de dimensionamento

Veja no desenho a seguir o esquema conceitual do Aproveitamento da Água de Chuva, onde é mostrado um modelo bem simples de filtro e separador da primeira água da chuva. Nesse modelo é usado uma peneira com malha fina, tipo tela mosquiteiro ou peneira grande de cozinha, e um recipiente que pode ser um vaso ou um balde com um registro instalado no fundo e um tubo na lateral conectando com a cisterna. O registro deverá ficar um pouquinho aberto para descartar a primeira água da chuva ou água de chuva fraca. Após alguns minutos de chuva (forte), esse balde estará cheio e vai começar a transbordar a água da chuva para dentro da cisterna através do tubo lateral. A água reservada na cisterna deve receber o tratamento com cloro de origem orgânica (cloro usado em piscinas). Lembre-se, solicite ao fabricante ou revendedor, mais informações sobre os cuidados e manuseios com esse cloro.

 

Aproveitamento da água da chuva
Aproveitamento da água da chuva.
Foto por Sempre Sustentável.
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CREA PR – Uso e Reúso da Água – Série de Cadernos Técnicos da Agenda Parlamentar; www.sempresustentavel.com.br