Cooperação internacional e sustentabilidade das florestas na Amazônia

Por sua privilegiada geografia, estruturas geológicas, diversidade cultural de suas populações e detentora de inestimável patrimônio de florestas (sociobiodiversidade), recantos ecoturísticos, jazidas minerais e mananciais de água doce: bens absolutamente vitais na aurora do século XXI – commodities do futuro; a Amazônia – maior fronteira de recursos naturais do planeta – megabioma que desafia saberes tradicionais e o conhecimento científico, diante das potencialidades e serviços que pode disponibilizar – biotecnologia, seqüestro de carbono, ciclos hidroquímicos, dentre outros, tem uma importância fundamental na gestação de um novo modelo de civilização – com a utilização racional de sua biomassa, conciliando o desenvolvimento sócio-econômico com a proteção do meio ambiente no plano local, nacional, regional e global. A Amazônia deixou de ser uma questão delimitada por visões simplistas; constituindo-se agora num complexo espaço multidimensional, plasmado por forças, movimentos e atores transnacionais, alcançando importância na agenda da política mundial.

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A Amazônia e suas florestas, como símbolo maior do ambientalismo ocidental, constituem um dos vetores principais da cooperação técnica-científica no cenário da globalização ecológica. Não por acaso, no imaginário ecológico internacional e dos centros mais urbanizados do país, a Amazônia existe unicamente pela simbologia da floresta. Certamente o recurso mais valioso da Amazônia são as suas florestas e a sustentabilidade delas requer uma outra perspectiva. A emergência de problemas ambientais como perda de biodiversidade e as mudanças climáticas na década de 1980, motivaram uma crescente preocupação com as florestas tropicais, e a Amazônia Brasileira, pela dimensão territorial e posição diferenciada que ocupa no cenário geopolítico da América do Sul, tornou-se centro das atenções da Comunidade Internacional, notadamente pelos riscos eminentes que a destruição da maior floresta do mundo poderia acarretar para o equilíbrio ecológico global.

A partir da década de 1990, o Brasil projeta-se como ponto de referência da cooperação internacional pelas vantagens comparativas que emergem de sua rica biodiversidade e seus impactos sobre o meio ambiente planetário, e particularmente a Amazônia torna-se um vasto espaço para investimentos e implementação de programas, projetos e pesquisas voltados para a conservação da natureza e experiências sustentáveis. Esta região tem sido alvo de esforço multilateral e de campaigners, envolvendo a participação de vários países, instituições financeiras e segmentos da sociedade civil mundial, tendo em vista o desafio da gestão coletiva das crises ecológicas globais.

Vale considerar o Fundo para o Meio Ambiente Global – GEF (Global Environment Facility), o Experimento de Grande Escala Biosfera-Atmosfera – LBA (The Large Scale Biosphere-Atmosphere Experiment in Amazônia), e o Programa Piloto para a Proteção das Florestas Tropicais do Brasil – PPG-7 (The Pilot Program to Conserve the Brazilian Rain Forest), dentre outros, além do envolvimento de Universidades e Centros de pesquisa com o propósito de alocar recursos humanos e tecnológicos para promover o desenvolvimento sustentável na região. Acrescente-se também a mobilização de movimentos ativistas transnacionais, como o Greenpeace, WWF (World Wildlife Fund), Conservation International, FOE (Friends of the Earth), dentre um número expressivo de ONGs e redes da sociedade civil – do local ao global. No plano regional, vale ressaltar outras iniciativas convergentes, como o Tratado de Cooperação Amazônica – TCA, assinado em 1978 (hoje revitalizado pela criação da Organização do Tratado de Cooperação Amazônica), a Associação das Universidades Amazônicas – UNAMAZ, fundada em 1987, e a implantação do Sistema de Informação da Amazônia – SIAMAZ, em 1992; que tem permitido a integração, trocas de experiências e avanços institucionais consideráveis entre os países que formam a Pan-Amazônia.

Com efeito, a implementação de vias sustentáveis de desenvolvimento sustentável na Amazônia passa inevitavelmente pela cooperação internacional, principalmente em função dos benefícios proporcionados pelos ecossistemas regionais à dinâmica do desenvolvimento continental e global, notadamente através da sustentabilidade da maior floresta tropical do planeta. O PPG-7 e o LBA são exemplos emblemáticos de como a interdependência e cooperação na área ambiental podem reverter, através da promoção de políticas públicas, tecnologias e produção de novos conhecimentos, em benefício das comunidades regionais e da mitigação das mudanças climáticas e proteção de biodiversidade no plano da governança global.

Pelo formato inovador de cooperação entre governos, sociedade civil e comunidade financeira internacional, o PPG-7 tem somado resultados positivos, através da demarcação de terras indígenas, projetos de reservas extrativistas e implementação de projetos demonstrativos comunitários. Por outro lado, o LBA constitui uma importante iniciativa de pesquisa comprometida com geração de conhecimentos nos aspectos ecológicos, climatológicos, biogeoquímicos e hidrológicos sobre a Amazônia. Na Terceira Conferência Científica, realizada em julho deste ano, o Programa LBA contabilizou avanços importantes: crescente formação de recursos humanos na área científica para estudos e pesquisas, possibilidades de planejamento estratégico para a pesquisa agrícola, através do conhecimento dos mecanismos que governam o clima e a vegetação e, fundamentalmente, a constatação de que a Amazônia contribui de modo significativo para limpar a atmosfera, prestando um serviço ambiental extremamente importante para o planeta. Ainda assim, o nível de recursos e investimentos aprovados pela cooperação internacional está muito aquém dos benefícios ecossistêmicos da região para a saúde da biosfera. No entanto, o fato de ter sido selecionada como área prioritária em termos de financiamento externo pelos países desenvolvidos, revela a importância estratégica da região na contribuição para a integridade do ecossistema planetário, e em decorrência disso, a sua influência na agenda dos principais atores da governança do sistema internacional.

Recentemente, a revista britânica The Economist afirmou que os países tropicais deveriam ser beneficiados economicamente por meio de algum tipo de desflorestamento. “Os Estados Unidos e a Europa derrubaram a maioria de suas florestas nos últimos séculos. Quem são eles para dizer à Indonésia, ao Brasil e ao Congo para fazer o contrário?”, indaga o editorial. Está na hora dos países ricos e desenvolvidos pagarem a conta pela conservação da floresta amazônica.

Alberto Teixeira da Silva é sociólogo, professor-adjunto do Departamento de Ciência Política da UFPA (alberts@amazon.com.br)