Jardinagem e Inclusão Social

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Um dos elos entre o sonho do primeiro emprego e a realidade de entrar no mercado de trabalho pode estar nas plantas. Acreditando nisso, Sergio Bruni (foto), que preside a Rede Brasileira de Jardins Botânicos desde 1997, e com a experiência de 10 anos na direção do Jardim Botânico do Rio de Janeiro, idealizou o Curso de Capacitação Profissional em Jardinagem, para jovens de 18 a 25 anos moradores de comunidades consideradas de risco social. Ele conquistou quatro parceiros e implantou o projeto piloto, que forma os primeiros técnicos neste mês de Abril.

Bruni detalha objetivos pretendidos com o curso: “Contribuir para o resgate da cidadania por meio da inserção profissional foi o nosso grande estímulo. Fizemos uma pesquisa com empresas de paisagismo e com profissionais de renome nesta área, e constatamos a enorme carência de pessoal preparado para o trabalho técnico com as plantas, seu correto uso, meios de preparo e manutenção de solos, entre outras questões. O curso suprirá as empresas de paisagismo, hortos, condomínios e outras organizações, com a mão de obra destes jovens, na maioria, em seu primeiro emprego, mas já capacitados e diplomados em jardinagem. Nossa expectativa é que os alunos, após a conclusão do curso, sejam absorvidos pelo mercado. Vamos reunir esforços para isso”.

Para Bruni, o ponto alto do curso é a qualidade curricular dos professores: “os professores são altamente especializados e temos até Doutores, o que é pouco comum em um curso profissionalizante. O balanceamento entre aulas teóricas e a prática mantém o entusiasmo e o crescente interesse do grupo, contribuindo para formar um espírito de corpo”.

Daniela Cunha de Magalhães, Engenheira Agrônoma e Supervisora do Curso de Jardinagem, conclui que é este espírito de equipe um dos resultados mais visíveis desta iniciativa: “Os alunos chegaram pensando e trabalhando individualmente. Falavam: ‘eu vou’, ‘eu pretendo’; com o decorrer das aulas, o discurso mudou e só falam em ‘nós’, o que significa que o espírito de cidadania também está plantado”.

Há quatro anos trabalhando em empresas de paisagismo e jardinagem, no Rio de Janeiro, o engenheiro agrônomo Bailes Tomiazzi, professor do curso, constata não haver mão-de-obra qualificada para suprir a demanda de um mercado em plena expansão. Ele adianta que a Prefeitura do Rio sinaliza, para os próximos anos, grandes investimentos em paisagismo e na criação e recuperação de áreas verdes da cidade, expandindo o mercado, nesse setor. Tomiazzi dá aulas práticas de Propagação de Plantas Ornamentais, Plantio e Manutenção e Restauro de Jardins. “Seguramente, muitos dos nossos futuros jardineiros terminarão o curso já com seu primeiro emprego garantido”, destaca.

Alunos

Eliane Oliveira de Melo, 22 anos, mora no Parque da Pedra Branca, há 20 anos protegido pelo Instituto Estadual de Florestas, e situado em Camorim. Seu pai é o responsável pela represa da área. Como outros jovens, ela sonha com a chance do primeiro emprego. Eliane leva uma vantagem: a consciência ecológica. Unindo sonho, vontade de realizar e respeito à natureza, ela respondeu à orientação do pessoal do Parque para fazer um Curso de Capacitação Profissional em Jardinagem. Com o ensino médio completo, ela destacou, no dia da matrícula, o que esperava do curso e do futuro: “ter mais chances de trabalho, conseguir o primeiro emprego e talvez até trabalhar lá mesmo. Dividir o conhecimento com outros jovens. Encaro este curso como uma continuidade da minha vida”.

Após um mês de aulas, Eliane mantém sua proposta e vai muito além: “mudei minha expectativa, que era mais pessoal. Aprendi muito, com as plantas e com todos, professores e colegas. Vejo o empenho de todos. Eu nem tinha intenção de continuar na área de meio ambiente. Passei para Letras, na Estácio de Sá, e desisti para fazer este curso, que me fez mudar o rumo do futuro. Vou investir neste aprendizado e decidi fazer um curso superior nesta área. Os professores estão orientando a turma e muitos de nós já buscam um pré-vestibular. Este curso é o melhor dos que já fiz, em todos os sentidos”.

Robson Souza Henrique, 18 anos, uma filha de 7 meses, atesta que o curso “é uma boa oportunidade para um futuro melhor. Gosto de plantas, cuido delas, na laje da minha casa. Curso o 1º ano do ensino médio, na Escola Ayrton Senna, e já fiz curso de informática, além de cursos extras de português, matemática e cidadania. Minha mulher trabalha em uma creche, onde ajudo, montando barracas e carregando mercadorias de uma feira que acontece aos sábados, no clube de lá. Depois do curso, terei uma profissão. Penso em transmitir o que aprendi aos amigos da comunidade, pois muitos já estão interessados. Para isso, buscarei apoio na associação de moradores e no comércio local.”

João Anderson Miranda Peres, 2 filhos, mora em Pedra de Guaratiba, ao Sul do Rio de Janeiro. Avalia o curso assim: “é a melhor oportunidade que já tive. Já trabalhava com jardins, mas com esforço físico e sem informação sobre as plantas. Teoria e prática fazem de mim, agora, um técnico em plantio e manutenção, com amplos conhecimentos em concepção de jardins”. Com 29 anos, ele estava além do limite do curso, mas batalhou pela vaga, não desistiu. No dia da matrícula, mesmo sabendo que dificilmente teria chance, foi ao Riocentro. Como um dos aprovados desistiu do curso, porque arrumara um emprego, ele ficou com a vaga: “aquele dia foi um dos mais importantes na minha vida”, lembra.

O curso e as parcerias

Grátis e com aulas em tempo integral, o Curso tem a duração de 45 dias. Os alunos recebem passagem, almoço e ajuda mensal. Do programa constam 18 disciplinas, a maioria nada comum nos cursos desta área, como, por exemplo: Ética e Cidadania, Cálculo em Paisagismo e Noções de Empreendedorismo – esta última, para possibilitar aos alunos, após a formatura, ter iniciativas para desenvolver seu próprio negócio. Para isso, eles recebem um conjunto de ferramentas, doado pela Tramontina, um dos parceiros do Projeto.

Eliane, Robson e João Anderson, assim como os demais jovens do curso, aprenderam também a importância de buscarem aliados quando a vontade de realizar não se deixa abater pelas dificuldades. Foi a união de parceiros que possibilitou o curso e pode tornar realidade o sonho do primeiro emprego.

Bailes Tomiazzi justifica a realização do curso esclarecendo que a falta de mão-de-obra qualificada atinge não só as pequenas empresas privadas cariocas como também algumas de grande porte que detêm 50% do mercado local de jardinagem. Responsáveis, entre outros empreendimentos recentes, pelos jardins do Centro Empresarial Mario Henrique Simonsen, com 30 mil m2 de área, e o Hotel Sheraton Barra, essas empresas são obrigadas a contratar pedreiros, balconistas e toda sorte de desempregados, pela carência de técnicos capacitados em jardinagem.

A Rede Brasileira de Jardins Botânicos, que congrega os 30 Jardins existentes no País, é a executora do projeto; a Petrobras a patrocinadora; a Fundação Xuxa ficou responsável pelo processo seletivo dos alunos (140 inscritos), pela avaliação do curso e por duas disciplinas (uma delas é Empreendedorismo); a Tramontina que doa as ferramentas usadas no curso e um kit para cada aluno, ao seu final. A Prefeitura da Cidade do Rio de Janeiro cede o Riocentro para as aulas teóricas e práticas e destinou uma área de 80 m2, onde os alunos criaram um jardim – o cartão-postal do projeto. O Riocentro foi escolhido pela grande concentração de hortos e empresas de paisagismo, em sua área, que abrange Vargem Grande, Barra e Pedra de Guaratiba e Camorim, além de favorecer a proximidade com os jovens das comunidades ao seu redor.

Doação do CD-ROM

Um CD-ROM com toda a programação do curso, incluindo material didático e metodologia para gerenciá-lo, será doado pela Petrobras, para qualquer instituição que queira realizar projeto idêntico, desde que sem fins lucrativos. O lançamento deste CD Rom será durante o Encontro da Rede Brasileira de Jardins Botânicos, em Belo Horizonte, em Julho próximo, quando cada um dos 30 Jardins nacionais receberá um kit completo para promover curso semelhante. A meta dos promotores do curso é espalhar esta iniciativa pelo Brasil afora, estendendo seus benefícios a diversas organizações – empresas, escolas, condomínios, hortos, florálias, igrejas etc. – que, em troca de realizarem o curso, ainda poderão ter jardins criados ou reformados, dando emprego aos jovens técnicos.

Por Lúcia Stela de Moura
Jornalista
Informações sobre a doação do CD-ROM
EMC – Empresa de Marketing Cultural