A biotecnologia representa hoje a nova fronteira da ciência. Ela trata de questões relativas a clonagem de seres vivos, inclusive do Homem, de pesquisas das células-tronco, da engenharia genética, da pesquisa e produção de produtos transgênicos etc. Como toda a ciência da qual decorrem produtos tecnológicos que podem ser usados para o bem ou para o mal, a biotecnologia provoca uma grande polêmica porque nela estão implicadas questões morais.
E porque estão implicadas questões morais, esse assunto merece um amplo debate público como meio adequado para produzir uma regulamentação legal e um controle político, tanto da pesquisa quanto da utilização da ciência biogenética. Em última instância, a manipulação dessa ciência pode proporcionar o domínio de um grupo de seres humanos por outro grupo, para fins condenáveis do ponto de vista dos valores humanísticos que se universalizaram na história civilizatória da humanidade. O uso inadequado da biotecnologia pode proporcionar também danos irreparáveis ao meio ambiente e à saúde humana.
Mas, por outro lado, a biotecnologia pode trazer enormes benefícios à humanidade, em várias áreas, como o combate a doenças, melhoramento da qualidade dos alimentos com conseqüências positivas para a saúde, produção de mais alimentos para combater a fome e preservação e melhoria da qualidade do meio ambiente. Justamente por representar ameaças terríveis e promessas animadoras e redentoras, a biotecnologia vem suscitando debates acalorados, polarizando opiniões.
De modo geral, o debate está polarizado entre duas opiniões. Um primeiro grupo agrega aqueles que poderíamos chamar como liberalizantes, que defendem que a sociedade e o governo não deveriam impor limites ao desenvolvimento da nova ciência biotecnológica. Fazem parte desse grupo alguns pesquisadores e cientistas, setores da indústria biotecnológica e empresas e pessoas interessadas em auferir lucros rápidos. O outro pólo é formado por religiosos, ambientalistas, intelectuais, pesquisadores e cientistas, que se posicionam contra a pesquisa e a utilização da biotecnologia por motivos diversos.
Nós defendemos que o debate seja despolarizado para que se possa produzir um posicionamento e uma legislação racionais sobre o assunto. A racionalidade, neste caso, implica que se bloqueiem os perigos inerentes ao uso da biotecnologia e que, ao mesmo tempo, se permita pesquisar e explorar todas as potencialidades positivas e benéficas aos seres humanos e ao meio ambiente que ela proporciona.
Técnicas e pesquisas relativas à clonagem de seres humanos, por exemplo, devem ser totalmente proibidas. Pesquisas e práticas biotecnológicas relativas ao combate de doenças, melhorias produtivas e preservação e melhoramento do meio ambiente devem ser estimuladas, sempre de acordo com uma regulamentação pública adequada.
O Partido dos Trabalhadores, desde sua origem, teve e continuará tendo uma preocupação com a adoção de medidas governamentais para a conquista de um meio ambiente adequado para a vida humana e preservação das demais espécies. É com esse espírito que o Partido defende que o Governo e o Congresso, após ampla discussão com a sociedade, dotem o País com uma legislação abrangente sobre biossegurança. A regulamentação da pesquisa, plantio, comercialização e consumo de produtos transgênicos deve ser definida no âmbito dessa legislação abrangente.
A Medida Provisória (MP) da soja transgênica, editada pelo governo, que vem provocando debates e polêmicas, teve como objetivo bloquear a disseminação de práticas ilegais relacionadas ao plantio e comercialização de variedades transgênicas. A Medida Provisória autorizou a venda, com rotulagem, de cerca de sete milhões de toneladas de soja transgênica produzida no Rio Grande do Sul. Autorizou também a prática de plantio, que já vinha se processando ilegalmente há vários anos.
A MP do governo, contudo, estabelece várias salvaguardas no cultivo das variedades transgênicas. Esse cultivo não pode afetar áreas indígenas, áreas de biodiversidade e mananciais. Com o objetivo de avançar no debate e na busca de soluções adequadas para a política ambiental do País, a Ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, está coordenando um grupo interministerial de trabalho.
O Partido dos Trabalhadores, por seu lado, aprimorará o debate interno sobre a política ambiental e buscará mediar postulações e reivindicações junto a entidades e ativistas legados ao meio ambiente, a outras instituições da sociedade interessadas no tema e ao governo.
Uma solução positiva para a política ambiental do País só será encontrada se a sociedade, o Governo, os Partidos e o Congresso adotarem uma postura construtiva na superação dos problemas e impasses. O sectarismo e o radicalismo em torno de um tema tão fundamental para o futuro da Humanidade só servirão para protelar soluções.
José Genoino – Presidente Nacional do Partido dos Trabalhadores
Revista Eco 21, Ano XIV, Edição 86, Janeiro 2004. (www.eco21.com.br)