Como enfrentar os danos das enchentes no Rio de Janeiro

Enchentes e inundações não são acontecimentos da atualidade. Há muito tempo a imprevisibilidade do clima e das chuvas preocupa as populações. Na verdade, como qualquer evento da natureza, as enchentes podem ser consideradas benéficas, sendo o principal benefício a renovação do ecossistema onde ocorrem, como por exemplo, os enormes encantos e belezas a partir de cheias em locais como o Pantanal do Mato Grosso. A cheia só é considerada indesejável quando resultante das ações pouco responsáveis da raça humana no meio ambiente.

É o caso das enchentes urbanas que castigam as grandes metrópoles e, particularmente, aquelas que ocorrem nos climas quentes e úmidos, como na cidade do Rio de Janeiro. É indiscutível que a ocupação desordenada das áreas urbanas desprovidas de infra-estrutura adequada tende a aumentar em magnitude e rapidez a ocorrência das inundações.

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O tratamento do problema das cheias urbanas vem sofrendo drásticas alterações nas últimas décadas, sob o ponto de vista da engenharia de recursos hídricos, “Crescimento sustentável” está na ordem do dia, sendo a escassez ou excesso de água, ou melhor, sua quantidade, característica totalmente indissociável da sua qualidade. Nas inundações urbanas temos obviamente os dois problemas concomitantes, porque as águas das enchentes são em geral contaminadas, e afetam a saúde da população tanto ou mais do que as próprias inundações. Porém aqui nos ateremos às causas dessas enchentes e o que fazer para minimizar seus impactos sociais e econômicos.

O conceito moderno de combate às enchentes encontra-se amarrado à necessidade de fazer os volumes escoados nas bacias urbanas se aproximarem o mais possível dos valores anteriores à ocupação e urbanização descontroladas e desordenadas. Isto recebe o nome da sigla inglesa BMP, ou melhores práticas de gerenciamento. Não são necessários conhecimentos técnicos profundos para se constatar que a urbanização torna impermeável boa parte do solo da bacia, reduzindo drasticamente a capacidade de infiltração e posterior recarga dos lençóis subterrâneos.

Nos países desenvolvidos atualmente é proibido impermeabilizar, e são empregados dispositivos simples como trincheiras de infiltração, “telhados verdes”, armazenamento e reuso em loteamentos, pavimentos permeáveis ou vazados, etc. Por outro lado, a ocupação de áreas de risco, tais como zonas próximas aos cursos de água ou canais, bem como áreas de encostas, contribui mais ainda para o agravamento do problema, além dos deslizamentos e desabamentos.

É triste notar que em geral são as populações mais carentes que, por falta de opção e de dinheiro, tendem a ocupar tais áreas de risco iminente. A proximidade de assentamentos em relação às calhas dos rios reduz enormemente a capacidade de escoamento da chamada calha secundária, que se destina a acomodar e conduzir as águas de inundação. A ocupação de encostas, por sua vez, torna ainda mais vulnerável a bacia urbana, tanto pela remoção da vegetação natural, que possui aspecto altamente protetor, retendo e ajudando a evaporação das águas de chuva, como pela exposição à erosão a que os solos desmatados ficam submetidos. As chuvas irão erodir tais solos e carrear mais material sólido, além do lixo, para as estruturas de drenagem, comprometendo seriamente sua capacidade.

 As soluções em longo prazo para evitar tais problemas passam pela elaboração conjunta de Planos Diretores Urbano e de Drenagem, com implementação de medidas que demandam tempo e dinheiro, porém este em muito menor quantidade do que as perdas monetárias com os prejuízos das inundações urbanas, comprovando a velha máxima do “mais vale prevenir do que remediar”.

No entanto cá estamos às portas do verão e as medidas devem ser de curto prazo, infelizmente. Ainda assim há muito que ser feito, principalmente quanto à manutenção da rede urbana de drenagem, por mais insuficiente que seja a mesma. Evitar o quanto possível a proliferação de ocupações irregulares do espaço urbano é fundamental. É preciso ainda efetuar dragagem dos rios e canais, cuidar da coleta e disposição regulares do lixo urbano e, principalmente, conscientizar a população em termos de educação ambiental.

Não jogar pequenos lixos nas ruas pode parecer atitude despretensiosa e isolada, porém se multiplicada por quase todos os habitantes da cidade fornece excelentes resultados para minimizar o impacto das inundações. É necessário que cada um faça sua pequena parte para o alcance de um todo ambientalmente mais agradável, menos agressivo e menos alagado.

Fonte: Flávio Cesar Borba Mascarenhas é Chefe do Laboratório de Hidráulica Computacional da Escola Politécnica da UFRJ – Universidade Federal do Rio de Janeiro.