Se aproxima o fim da era dos combustíveis fósseis

Os organismos geneticamente modificados (OGM) tanto podem estar aí para o bem, como para o mal. Há diversos casos na ciência que demonstram isto. No caso da soja transgênica temos um caso que não somente se deriva para o mal – devido às incertezas científicas que a cerca -, como temos o risco do monopólio econômico, do aumento da concentração de renda e da desigualdade social. Se associarmos esses fatos à monocultura, pode-se constatar um quadro trágico de degradação ambiental e exclusão social no campo. Este modelo, somado à atual estiagem do Sul, já quebrou dezenas de agricultores familiares que não diversificaram suas culturas, acreditando no “canto de sereia” (leia-se Monsanto e outras) do lucro imediato. A cada ano a perda de solo e a contaminação dos lençóis freáticos comprovam a falência da agricultura convencional.

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Com a aprovação pela Câmara do Projeto de Lei de Biossegurança, para liberação dos transgênicos no Brasil, fica facultativo o licenciamento ambiental, eliminando a obrigatoriedade da apresentação de estudos de impacto no ambiente e na saúde. Portanto, o Presidente Lula poderá vetar o PL e nos livrar das chamadas “comidas frankenstein”. Em outras palavras, Lula pode decidir se os brasileiros terão alimentos transgênicos legalizados na mesa ou não.

Fora de que o PL poderia ser considerado inconstitucional, uma vez que ignora a Lei de Proteção a Biodiversidade, ele ainda concede todo o poder à Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio) – órgão vinculado ao Ministério da Ciência e Tecnologia – para decidir sobre os OGMs, retirando as competências dos Ministérios do Meio Ambiente, da Saúde e da Agricultura sobre cada um dos casos.

Assim ficamos apenas com um grupo de apenas 27 membros “escolhidos a dedo” pelo Ministro de Ciência e Tecnologia para serem somente eles os que decidirão sobre o tipo de comida a que milhões de brasileiros terão acesso. O agravante é que as reuniões dos super-poderosos da CTNBio podem se realizar com apenas a metade dos membros mais um (14) e as aprovações podem acontecer com voto favorável de apenas 8 membros, mesmo para aprovação de plantios comerciais.

Quatro dos 8 pesquisadores titulares da CTNBio desenvolvem plantas transgênicas, são especialistas em biotecnologia, sendo que dois deles são Conselheiros do CIB, ONG financiada pela Monsanto e pelas demais indústrias da biotecnologia. Os outros 4 pesquisadores titulares são especialistas em áreas que não a biossegurança. Essa parcialidade da Comissão aliada à falta de especialistas em impacto dos OGM mostra que a CTNBio não pode ser a instância final de decisão sobre transgênicos.

A parcialidade aqui fica evidente na histórica luta contra e a favor dos transgênicos, uma vez que esta Comissão é acusada de se colocar sempre na posição de defesa da biotecnologia, tentando apressar a liberação dos transgênicos.

Não se trata somente da ameaça de contaminação de produções de alimentos convencionais e orgânicos por parte do cultivo de transgênicos (já comprovado em inúmeros casos nos Estados Unidos e Canadá), mas também há o problema da saúde humana estar sendo afetada. Isto ficou claro em diversos estudos e, particularmente, através do artigo “Safety Testing and Regulation of Genetically Engineered Foods”, publicado na revista “Biotechnology and Genetic Engineering Reviews”, de Novembro de 2004, onde os cientistas David Schubert e William Freese denunciaram que um tipo de milho – MON810 da Monsanto – produzido nos Estados Unidos, podia causar alergia alimentar as pessoas. O caso também envolvia a EPA (Environmental Protection Agency), órgão equivalente ao nosso Ministério do Meio Ambiente, acusada de ignorar estudos que comprovavam a alergia resultante deste tipo de milho.

A legislação brasileira, através de Decreto, também exige que produtos que contenham mais de 1% de matéria-prima transgênica apresentem em seus rótulos a devida informação. No entanto, o que se vê é uma total ausência do Estado para se garantir a fiscalização de que isto esteja sendo cumprido. A sociedade brasileira é refém de grandes corporações que se julgam acima da Lei, sendo que a Monsanto é uma delas.

Deveria ser dever do Estado aplicar o Princípio de Precaução da Convenção das Nações Unidas sobre Biodiversidade no caso de haver dúvidas quanto aos riscos ambientais e de saúde aos quais poderá ficar exposta a sociedade brasileira; devia ser dever do Governo brasileiro impedir as táticas de monopólio empregadas pelas grandes empresas do agronegócio. Deveria ser dever do Presidente Lula defender os ideais democráticos do PT, garantindo que uma Comissão inter e multidisciplinar possa decidir sobre os transgênicos e não apenas meia dúzia de gatos pingados que podem estar “transgenicamente cooptados”!

A alternativa que resta à sociedade civil é protestar. Afinal, mais de 80% dos brasileiros se declararam contra liberação dos transgênicos numa pesquisa do Greenpeace/ISER. Há várias organizações que colocam seus sites a disposição para isto, como por exemplo: http://www.greenpeace.org.br/brasilmelhor.

Direitos e deveres muitas vezes se confundem. Protestar é um direito, assim como agir para garantir que a democracia seja praticada é um dever.

Por José Walter Bautista Vidal (Engenheiro e Físico Nuclear, Professor aposentado da UnB, Presidente do Instituto do Sol)
Fonte: Revista Eco 21, ano XV, Nº 100, março/2005.