Conservação de ramais e estradas: necessidade de rever conceitos

Durante o período chuvoso, em que os ramais ficam intrafegáveis, surgem as principais reclamações dos usuários quanto a sua conservação e manutenção. Na maioria das regiões brasileiras, a idéia de “passar a máquina” predomina como alternativa aos produtores rurais e prefeituras, para minimizar o problema dos atoleiros, valetas e barrancos instáveis, criados pela força das enxurradas, nos ramais não pavimentados.

Essa é, entretanto, uma solução temporária que repetida inúmeras vezes, a cada estação seca, acaba por afundar o leito da estrada, transformando-o em calha para as águas da chuva e tornando os igarapés cada vez mais rasos por assoreamento.

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Uma alternativa usada há 4 anos pela Secretaria de Agricultura e Abastecimento do Estado de São Paulo, baseada na mesma lógica da conservação de solo dentro das lavouras, consiste em recompor o leito da estrada, preenchendo-o até sua altura original, com a adoção de curvas de nível contínuas, que integram estrada e campos de cultivo.

Essa alternativa permite que a água das chuvas não se concentre no leito dos ramais, não ganhe a força das enxurradas e que seja canalizada para as caixas de contenção, dentro das áreas produtivas, aumentando a infiltração no solo e conseqüente a disponibilidade de água para as plantas ou animais.

No Estado do Acre, onde há grande preocupação em adotar políticas de desenvolvimento sustentável, esse tipo de prática deveria ser rapidamente implementado. O ideal seria a construção, no próximo verão amazônico, de um a três trechos demonstrativos com pelo menos 5 km cada, nos principais projetos de assentamento. A escolha dos trechos deve ser feita com a participação dos produtores, prefeituras e usuários, optando-se por aqueles de maior trânsito e em áreas de relevo mais acidentado.

Esse novo conceito de conservação de estradas deve ainda passar a integrar políticas de conservação do solo, com a adoção de práticas de controle de processos erosivos. A erosão causa a perda da produtividade das terras devido ao arraste das camadas superficiais do solo pelas enxurradas, justamente aquelas que reúnem as melhores condições de fertilidade, de modo que os prejuízos para a agricultura e pecuária são imensos.

Por esse motivo, a conservação e manutenção dos ramais são ações pertinentes à gestão integrada de microbacias, adotando-se técnicas de cultivo que possibilitem manter a cobertura vegetal do solo (para aumentar a infiltração da água de chuva), promover a recuperação de matas ciliares, fazer plantio direto e adubação verde, e construir terraços de controle da erosão, entre outras medidas.

A política de desenvolvimento para a área agrícola deve ser responsável e trabalhar na conscientização de técnicos e produtores sobre a necessidade de mudar hábitos arraigados decorrentes das práticas da agricultura migratória e de derrubada e queima, somente extraindo da terra seus frutos, sem cuidar para sua conservação.

Além dos enormes benefícios ambientais que o controle da erosão nos ramais e áreas cultivadas pode proporcionar, um programa dessa natureza poderá melhorar a trafegabilidade das estradas e assim permitir diversificar a produção, facilitando o acesso às cidades e o escoamento da produção agrícola nos meses mais críticos.

A Embrapa Acre realizou pesquisas visando quantificar a intensidade dos processos erosivos e adaptar soluções para seu controle, bem como avaliando leguminosas com potencial para a recuperação e conservação dos solos. Recentemente, preparou uma publicação destinada a orientar técnicos e profissionais da área agrícola sobre técnicas de construção de terraços para controle da erosão. A integração dos terraços com a conservação dos ramais poderá proporcionar um desenvolvimento agrícola com responsabilidade ambiental.

Paulo Guilherme Salvador Wadt, pesquisador, Embrapa Acre. paulo@cpafac.embrapa.br