As plantas aquáticas podem ser classificadas dentro das seguintes duas categorias bem amplas (Thomann e Mueller, 1987):
Plantas que se movem livremente com a água (plantas aquáticas planctônicas): incluem o fitoplâncton microscópico, plantas flutuantes e certos tipos de plantas, como as algas cianofíceas, que podem flutuar na superfície e mover com a corrente superficial;
Plantas fixas (aderidas ou enraizadas): incluem as plantas aquáticas enraizadas de diversos tamanhos e as plantas microscópicas aderidas (algas bênticas).
As algas são, portanto, uma designação abrangente de plantas simples, a maior parte microscópica, que incluem tanto as plantas de movimentação livre, o fitoplâncton e as algas bênticas aderidas. Em todos os casos, as plantas obtêm a sua fonte de energia primária da energia luminosa através do processo de fotossíntese.
A eutrofização é o crescimento excessivo das plantas aquáticas, tanto planctônicas quanto aderidas, a níveis tais que sejam considerados como causadores de interferências com os usos desejáveis do corpo d’água (Thomann e Mueller, 1987). O principal fator de estímulo é um nível excessivo de nutrientes no corpo d’água, principalmente nitrogênio e fósforo.
Fatores agravantes:
a) Ocupação por matas e florestas
Um lago situado em uma bacia de drenagem ocupada por matas e florestas apresenta usualmente uma baixa produtividade, isto é, há pouca atividade biológica de produção (síntese) no mesmo. Mesmo nestas condições naturais e de ausência de interferência humana, o lago tende a reter sólidos que se sedimentam, constituindo uma camada de lodo no fundo. Com os fenômenos de decomposição do material sedimentado, há um certo aumento, ainda incipiente, do nível de nutrientes na massa líquida. Em decorrência, há uma progressiva elevação na população de plantas aquáticas na massa líquida e, em consequência, de outros organismos situados em níveis superiores na cadeia alimentar (cadeia trófica).
Na bacia hidrográfica, a maior parte dos nutrientes é retida dentro de um ciclo quase fechado. As plantas, ao morrerem e caírem no solo, sofrem decomposição, liberando nutrientes. Numa região de matas e florestas, a capacidade de infiltração da água de chuva no solo é elevada. Em consequência, os nutrientes lixiviam pelo solo, onde são absorvidos pelas raízes das plantas, voltando a fazer parte da sua composição, e fechando, desta forma, o ciclo. O aporte de nutrientes ao corpo d’água é reduzido.
Pode-se considerar que o corpo d’água apresente ainda um nível trófico bem incipiente.
b) Ocupação por agricultura
A retirada da vegetação natural da bacia para ocupação por agricultura representa, usualmente, uma etapa intermediária no processo de deterioração de um corpo d’água. Os vegetais plantados na bacia são retirados para consumo humano, muito possivelmente fora da própria bacia hidrográfica. Com isto, há uma retirada, não compensada naturalmente, de nutrientes, causando uma quebra no ciclo interno dos mesmos. Para compensar esta retirada, e para tornar a agricultura mais intensiva, são adicionados artificialmente, fertilizantes, isto é, produtos com elevados teores dos nutrientes nitrogênio e fósforo. Os agricultores, visando garantir uma produção elevada, adicionam quantidades elevadas de N e P, frequentemente superiores à própria capacidade de assimilação dos vegetais.
A substituição das matas por vegetais agricultáveis pode causar também uma redução da capacidade de infiltração no solo. Assim, os nutrientes, já adicionados em excesso, tendem a escoar superficialmente pelo terreno, até atingir, eventualmente, o lago ou represa.
O aumento do teor de nutrientes no corpo d’água causa um certo aumento do número de algas e, em consequência, dos outros organismos, situados em degraus superiores da cadeia alimentar, culminando com os peixes. Esta elevação relativa da produtividade do corpo d’água pode ser até bem-vinda, dependendo dos usos previstos para o mesmo. O balanço entre os aspectos positivos e negativos dependerá, em grande parte, da capacidade de assimilação de nutrientes do corpo d’água (a ser detalhada posteriormente neste capítulo).
c) Ocupação urbana
Caso se substitua a área agricultável da bacia hidrográfica por ocupação urbana, uma série de consequências irá ocorrer, desta vez em taxa bem mais rápida.
Assoreamento. A implantação de loteamentos implica em movimentos de terra para as construções. A urbanização reduz também a capacidade de infiltração das águas no terreno. As partículas de solo tendem, em consequência, a seguir pelos fundos de vale, até atingir o lago ou represa. Aí, tendem a sedimentar, devido às baixíssimas velocidades de escoamento horizontal. A sedimentação das partículas de solo causa o assoreamento, reduzindo o volume útil do corpo d’água, e servindo de meio suporte para o crescimento de vegetais fixos de maiores dimensões (macrófitas) próximos às margens. Estes vegetais causam uma evidente deterioração no aspecto visual do corpo d’água.
Drenagem pluvial urbana. A drenagem urbana transporta uma carga muito maior de nutrientes que os demais tipos de ocupação da bacia. Este aporte de nutrientes contribui para uma elevação no teor de algas na represa.
Esgotos. O maior fator de deterioração está, no entanto, associado aos esgotos oriundos das atividades urbanas. Os esgotos contêm nitrogênio e fósforo, presentes nas fezes e urina, nos restos de alimentos, nos detergentes e outros subprodutos das atividades humanas. A contribuição de N e P através dos esgotos é bem superior à contribuição originada pela drenagem urbana.
Há, portanto, uma grande elevação do aporte de N e P ao lago ou represa, trazendo, em decorrência, uma elevação nas populações de algas e outras plantas. Dependendo da capacidade de assimilação do corpo d’água, a população de algas poderá atingir valores bastante elevados, trazendo uma série de problemas, como detalhado no item seguinte. Em um período de elevada insolação (energia luminosa para a fotossíntese), as algas poderão atingir superpopulações, constituindo uma camada superficial, similar a um caldo verde. Esta camada superficial impede a penetração da energia luminosa nas camadas inferiores do corpo d’água, causando a morte das algas situadas nestas regiões. A morte destas algas traz, em si, uma série de outros problemas. Estes eventos de superpopulação de algas são denominados floração das águas.
PROBLEMAS DA EUTROFIZAÇÃO
São os seguintes os principais efeitos indesejáveis da eutrofização (Arceivala, 1981; Thomann e Mueller, 1987; von Sperling, 1994):
Problemas estéticos e recreacionais. Diminuição do uso da água para recreação, balneabilidade e redução geral na atração turística devido a:
Frequentes florações das águas;
Crescimento excessivo da vegetação;
Distúrbios com mosquitos e insetos;
Eventuais maus odores;
Eventuais mortandades de peixes.
Condições anaeróbias no fundo do corpo d’água. O aumento da produtividade do corpo d’água causa uma elevação da concentração de bactérias heterotróficas, que se alimentam da matéria orgânica das algas e de outros microrganismos mortos, consumindo oxigênio dissolvido do meio líquido. No fundo do corpo d’água predominam condições anaeróbias, devido à sedimentação da matéria orgânica, e à reduzida penetração do oxigênio a estas profundidades, bem como à ausência de fotossíntese (ausência de luz). Com a anaerobiose, predominam condições redutoras, com compostos e elementos no estado reduzido:
O ferro e o manganês encontram-se na forma solúvel, trazendo problemas ao abastecimento de água;
O fosfato encontra-se também na forma solúvel, representando uma fonte interna de fósforo para as algas;
O gás sulfídrico causa problemas de toxicidade e maus odores.
Eventuais condições anaeróbias no corpo d’água como um todo. Dependendo do grau de crescimento bacteriano, pode ocorrer, em períodos de mistura total da massa líquida (inversão térmica) ou de ausência de fotossíntese (período noturno), mortandade de peixes e reintrodução dos compostos reduzidos em toda a massa líquida, com grande deterioração da qualidade da água.
Eventuais mortandades de peixes. A mortandade de peixes pode ocorrer em função de:
Anaerobiose (já comentada acima);
Toxicidade por amônia. Em condições de pH elevado (frequentes durante os períodos de elevada fotossíntese), a amônia apresenta-se em grande parte na forma livre (NH3), tóxica aos peixes, ao invés de na forma ionizada (NH4+), não tóxica.
Maior dificuldade e elevação nos custos de tratamento da água. A presença excessiva de algas afeta substancialmente o tratamento da água captada no lago ou represa, devido à necessidade de:
Remoção da própria alga;
Remoção de cor;
Remoção de sabor e odor;
Maior consumo de produtos químicos;
Lavagens mais frequentes dos filtros.
Problemas com o abastecimento de águas industrial. Elevação dos custos para o abastecimento de água industrial devido a razões similares às anteriores, e também aos depósitos de algas nas águas de resfriamento.
Toxicidade das algas. Rejeição da água para abastecimento humano e animal em razão da presença de secreções tóxicas de certas algas.
Modificações na qualidade e quantidade de peixes de valor comercial
Redução na navegação e capacidade de transporte. O crescimento excessivo de macrófitas enraizadas interfere com a navegação, aeração e capacidade de transporte do corpo d’água.
Desaparecimento gradual do lago como um todo. Em decorrência da eutrofização e do assoreamento, aumenta a acumulação de matérias e de vegetação, e o lago se torna cada vez mais raso, até vir a desaparecer. Esta tendência de desaparecimento de lagos (conversão a brejos ou áreas pantanosas) é irreversível, porém usualmente extremamente lenta. Com a interferência do homem, o processo pode se acelerar abruptamente. Caso não haja um controle na fonte e/ou dragagem do material sedimentado, o corpo d’água pode desaparecer relativamente rapidamente.
Lago eutrofizado.
Foto por Csehak Szabolcs.
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Bibliografia: MULLER. A. C., Introdução à Ciência Ambiental; Curitiba – PUC-PR; uso didático. Págs. 67 a 73.