O meio ambiente sofre com o desenvolvimento que representa um fator de risco, devido às atividades humanas sem controle, os despejos de esgotos sem tratamento, vazamentos de produtos tóxicos e a disposição inadequada de resíduos sólidos que vêm causando uma degradação vertiginosa do meio ambiente e uma dilapidação do capital natural. As ações de saneamento são entendidas como instrumento para promoção da saúde, prevenção e controle de doenças. Entretanto, a cobertura de serviços no que se refere ao esgotamento sanitário e de resíduos sólidos, bem como ao controle da qualidade da água para consumo humano ainda é deficitário no Brasil.
Durante a 1ª Conferência das Cidades, que ocorreu em Brasília no mês de outubro de 2003, o Superintendente Executivo da Associação Nacional das Empresas de Saneamento Básico Estaduais (AESBE) enfatizou “a necessidade do País encarar de frente, a questão do esgotamento sanitário”. Ao longo da última década, os indicadores de comportamento do Setor de Saneamento vêm revelando dificuldades crescentes em relação à necessidade de universalização da prestação dos serviços à população brasileira e até mesmo para a manutenção dos níveis de cobertura já alcançados.
Nesse contexto a população brasileira se prepara para rediscutir a urgente necessidade de uma política nacional para o saneamento. Políticas que garantam investimentos permanentes tanto para ampliação, como aperfeiçoamento do sistema já implantado. A visão dos sanitaristas presentes no 22º Congresso Brasileiro de Engenharia Sanitária e Ambiental é que “mais do que garantir a implantação dos equipamentos de saneamento, é preciso assegurar a sua operacionalidade, após a conclusão das obras. É preciso garantir através de programas claros considerando, dentre outros fatores, as diferenças regionais e mecanismos de controle social que garantam a eficiência do sistema, de forma que o investimento não acabe com o final da obra”.
Este contexto do saneamento nacional se reflete nas exigências crescentes feitas pela legislação ambiental, como pela Resolução CONAMA 274/2000 que classifica as águas destinadas à recreação. Os corpos d’água contaminados por esgotos sanitários expõem os banhistas a riscos de doenças, devido à presença de bactérias, vírus e protozoários e têm contribuído para acelerar a instalação de sistema de coleta e tratamento de esgoto sanitário. A balneabilidade das águas reflete a qualidade destas, destinadas ao uso de recreação, sendo este entendido, como contato direto e prolongado com a água (natação, mergulho, esportes aquáticos, etc), onde a possibilidade de ingerir quantidades apreciáveis de água é elevada. Para sua avaliação são estabelecidos critérios objetivos.
Estes critérios se baseiam em indicadores a serem monitorados e seus valores são confrontados com padrões pré-estabelecidos, para identificar condições de balneabilidade em um determinado local, inclusive para definir classes orientando melhor os usuários. De acordo com a classificação estabelecida pela Resolução, as águas impróprias para banho são as que apresentam acima de 1.000 coliformes fecais por 100 mL de água, em no mínimo duas amostras de cinco analisadas, ou quando o valor obtido na última amostragem for superior a 2.500 coliformes fecais ou 2.000 Escherichia coli. A Escherichia coli é abundante nas fezes humanas e de animais, pois o trato intestinal é o habitat desta bactéria.
A Fundação Estadual de Proteção Ambiental (Fepam) – órgão vinculado à Secretaria Estadual do Meio Ambiente do RS executa anualmente, no período do verão (segunda quinzena de novembro e primeira de março), o Projeto Balneabilidade. O Projeto consiste em monitorar os balneários através de coletas semanais de água para análise, nos dias de maior movimento de veranistas. Para alertar o público a Fepam coloca placas de sinalização indicando as condições, em frente aos pontos onde são coletadas amostras de água. A constatação de valores elevados de coliformes fecais indica contaminação fecal que poderá ocasionar riscos à saúde dos banhistas, sendo que a gravidade do risco depende da saúde da população geradora e do grau de imunidade dos banhistas. A divulgação dos resultados das análises, no início do veraneio gaúcho evidenciou diversas situações de melhoria da qualidade em balneários historicamente impróprios, como no Laranjal. E situações opostas de comprometimento de qualidade, como em alguns pontos do Litoral Norte do Estado. Alguns dos resultados negativos foram detectados, mesmo com a implantação de estações de tratamento, apontando como causas possíveis:
- a provável ligação de esgoto sanitário à rede pluvial, fazendo com que o esgoto ao invés de ser encaminhado ao tratamento seja despejado in natura no meio ambiente;
- a ausência de unidades de tratamento, ou mesmo dificuldades operacionais nas unidades implantadas;
- a cobertura insuficiente de redes de esgoto.
O problema se agrava quando o índice pluviométrico ultrapassa os índices normais para um dado período do ano. Os balneários de água doce, geralmente estão localizados no interior do Estado e em zona predominantemente rural, onde a atividade agropecuária é a principal fonte de renda, enfrentam igualmente o problema, apesar da baixa densidade populacional. Em época de maior incidência de chuvas, como ocorreu no mês de dezembro de 2003, muitos destes balneários apresentaram condições impróprias para a recreação. As fezes oriundas das criações de animais somadas aos dejetos humanos, a redução da capacidade de infiltração do solo, a ausência de tratamento e o grande volume de chuva favoreceram que esta carga atingisse os mananciais de água evidenciando o elevado índice de coliformes nas amostras analisadas.
Mesmo que o volume de chuva se normalize e que a balneabilidade seja recuperada, o problema necessita ser enfrentado, pois o esgoto lançado a céu aberto irá, mais dia menos dia, comprometer o solo, as águas subterrâneas e atingirá as águas superficiais. Os investimentos para despoluição são sempre maiores que os necessários para a implantação de tratamentos preventivos, que garantirão a qualidade do meio ambiente reduzindo os riscos à saúde pública, o comprometimento ambiental, os reflexos negativos à economia e à imagem da região. Para garantir a saúde ambiental, a comunidade juntamente com os setores competentes, necessita abandonar a visão reativa, ou seja, apenas enfrentar o problema quando ele se evidencia em cada verão. É necessária a implantação de estratégias ambientais preventivas, que busquem soluções integradas para resíduos sólidos, esgotos e água, garantindo não só a qualidade ambiental, mas, sobretudo, a sustentabilidade dos recursos naturais e do meio ambiente.
Bibliografia: Água abundância e escassez. A gestão por bacias (2002). Disponível em: http://www.comciencia.br/reportagens/aguas/aguas04.htm. Acesso em: 29/05/2002.
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CETESB (2004). Disponível em http://www.cetesb.sp.gov.br. Acesso em 05/01/2004.
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HAWNEN, P.; LOVINS A.; LOVINS L. H. (1998). Capitalismo Natural- Criando a Próxima Revolução Industrial. São Paulo: Editora Cultrix, 1999. 358 p.
Lauro Charlet Pereira – Dr. em Planejamento Ambiental – UNICAMP Pesquisador da Embrapa Meio Ambiente – SP
Marta Regina Lopes Tocchetto – Doutoranda em Engenharia Metalúrgica, dos Materiais e de Minas – UFRGS Prof. da Universidade Federal de Santa Maria