Freqüentemente, os meios de comunicação de massa provocam na população a falsa expectativa, de que medidas implementadas para solucionar um problema serão diretamente proporcionais à divulgação que foi dada ao fato. Quando se trata da questão ambiental, entre outros temas, sabemos que isto absolutamente não corresponde aos fatos. O Brasil, com sua diversidade de biomas, sua extensão territorial, e, principalmente, sua disparidade social, padece de problemas ambientais, amplamente divulgados, para os quais as soluções estão longe de terem sido encaminhadas. As cidades brasileiras concentram cerca de 70% da população brasileira e grande parte dos problemas ambientais do País.
A situação é similar a de cidades de outros países e períodos históricos, condicionados por fatores econômicos e sociais semelhantes. Investimentos em meio ambiente no Brasil, principalmente para minorar os problemas ambientais urbanos, totalizaram cerca de US$ 3 bilhões em 2004, aproximadamente 0,5% do PIB brasileiro. Comparados com outros setores da economia do País são investimentos diminutos, refletindo uma visão econômica de curto prazo e ignorância do inter-relacionamento entre as atividades econômicas e a natureza. Para a maioria dos agentes, governos e empresários, a questão ambiental ainda não é prioritária, pois requer alocação de recursos que – sob uma ótica imediatista e limitada – não trazem retorno significativo e não são prioritários.
Em termos de investimento, o maior segmento do mercado ambiental brasileiro é o de saneamento básico, que inclui o tratamento de água e de esgoto doméstico. Trata-se de um dos maiores problemas enfrentados nos centros urbanos de todo o País. Segundo dados publicados pelo IBGE (2002) ao redor de 23% dos domicílios (cerca de 9,9 milhões de unidades), não contavam com abastecimento de água pela rede pública. Quanto ao esgoto doméstico, somente 47,2% dos domicílios estavam ligados às redes coletoras, mas apenas 20% do volume coletado são tratados; sendo que os dados atuais não são muito diferentes dos de 2002.
Os valores investidos em novos projetos de saneamento alcançaram aproximadamente US$1,3 bilhão em 2004, representando cerca de 0,02% do PIB. Muito abaixo, portanto, do limite mínimo de 1% do PIB, estabelecido pela Organização Mundial de Saúde para países com IDH (Índice de Desenvolvimento Humano) equivalente ao do Brasil. O problema é de tal gravidade, que segundo o Ministério da Saúde 65% das internações hospitalares no País são decorrentes da má qualidade (ou inexistência) dos serviços de saneamento.
Outro impacto ambiental negativo decorrente da falta de infra-estrutura para o tratamento dos efluentes, é a crescente degradação ambiental dos cursos de água. Dados preliminares de uma pesquisa ainda em andamento, informam que cerca de 70% dos rios das regiões Sudeste e Sul estão contaminados, principalmente por efluentes domésticos, provocando o desaparecimento de muitos tipos de peixes e outras espécies aquáticas. O custo do desaparecimento destas espécies e da destruição de seus hábitats ainda não foi contabilizado. Outro impacto negativo, mais facilmente mensurável, é o aumento dos custos de tratamento da água bruta, retirada dos rios poluídos e destinada ao consumo humano.
O problema do saneamento não é tão recente quanto parece. Desde a década de 1950, investimentos feitos por governos estaduais e municipais não vêm acompanhando o aumento da demanda, causada pelo rápido crescimento populacional nas cidades. Some-se a isto, a falta de planejamento urbano e a constante redução dos orçamentos, a fim de atender programas de ajuste econômico. Com relação à água, a situação sempre foi diferente: era rapidamente fornecida, já que sem ela não era possível abrir novos loteamentos, aumentando as receitas municipais com a cobrança de impostos e taxas.
O segundo mais importante segmento do mercado ambiental é o de gerenciamento de resíduos urbanos, principalmente o lixo doméstico. Estima-se que este mercado – junto com o de resíduos industriais -, movimentou cerca de US$1.5 bilhões em 2004. O valor parece considerável, mas pouco representa para um país que gera diariamente cerca de 110.000 toneladas de lixo. Deste volume, aproximadamente 70% é regularmente coletado por serviços instituídos pelos municípios. Depois da coleta começa a segunda fase do problema: a destinação final do lixo doméstico. Problema, porque são poucos os municípios brasileiros que dispõem de um aterro sanitário, construído segundo normas técnicas recomendadas pelas agências ambientais. A maioria dos 5.507 municípios utiliza-se de buracos cavados no solo, “lixões”, sem qualquer tipo de isolamento, onde são jogados os resíduos municipais.
Em muitas cidades, para agravar a situação, aos resíduos domésticos se juntam os resíduos hospitalares e até os industriais – perigosa convivência, tolerada ou ignorada pelo poder municipal. A reciclagem, bastante analisada pelos meios de comunicação, é praticada somente em cerca de 300 municípios brasileiros, pouco representando para a economia. A legislação que poderia impulsionar este setor ainda espera uma aprovação do Congresso.
Quanto aos resíduos perigosos industriais, dados pesquisados pela Associação Brasileira de Empresas de Tratamento Recuperação e Disposição de Resíduos Especiais (ABETRE) e pelo Departamento de Meio Ambiente da Câmara Brasil-Alemanha, dão conta de que anualmente são geradas, em todo o País, cerca de 2,7 milhões de toneladas. A maior parte destes resíduos provém de atividades industriais, principalmente nas regiões Sul e Sudeste.
Cerca de 20% deste volume é disposto corretamente em aterros sanitários Classe I ou incinerado. Outra parte dos resíduos é estocada, geralmente nas próprias empresas geradoras, aguardando uma destinação final (que pode demorar anos). Muitas empresas ainda consideram altos os custos de destinação final de resíduos, disponíveis no mercado. Ainda resta-nos fazer uma breve referência à poluição atmosférica.
Segundo dados da agência ambiental de São Paulo (CETESB) cerca de 85% da poluição atmosférica urbana é gerada por veículos automotores. Os 15% restantes ficam por conta das atividades industriais. Para minorar a poluição nos grandes centros já foram ensaiados diversos programas de controle de emissão veicular, porém sem sucesso.
Na cidade de São Paulo, por exemplo, foi iniciado um programa de controle de emissão veicular voluntário em 1997. No Estado, a CETESB também já apresentou duas propostas em épocas diferentes (a última em 2002), sem que nenhuma delas se concretizasse. A atual administração da cidade de São Paulo pretende instituir o controle da emissão veicular a partir de 2006. A proposta já esta sendo criticada em diversos aspectos, principalmente por representar mais uma taxa cobrada do proprietário do veículo.
As notícias na mídia, sozinhas, da mesma forma que a elaboração de Leis e a criação de programas nos moldes atuais, não trarão a solução para os problemas ambientais. Continuamos esperando que as administrações (federal, estaduais ou municipais) criem mecanismos que possibilitem à sociedade participar ativamente no desenvolvimento de implementação das soluções necessárias; ou, pelo menos, que não as impeçam.
Por Ricardo Rose, Jornalista e Diretor de Meio Ambiente da Câmara de Comércio Brasil-Alemanha
Fonte: Revista Eco 21, ano XV, Nº 103 junho/2005.