O Paraná derrubou 80% de sua cobertura vegetal. O que resta hoje é 20% do que havia cem anos atrás. Não há mais nem 1% de nossa floresta de araucária em pé. Em outras palavras, aniquilamos 99% daquelas a quem, hipocritamente, chamamos árvore-símbolo.
A retirada da cobertura vegetal de uma localidade aquece e torna pobre o solo, aumenta a poluição e o assoreamento dos rios, reduz a biodiversidade, altera a velocidade dos ventos, aumenta a temperatura do ar e modifica, irreversivelmente, o microclima local.
Na parte de cima do solo, a alteração agride primeiramente os insetos, muitos deles, polinizadores. Sem mecanismos de adaptação rápida, eles se transferem para locais onde o clima seja menos hostil. Sua fuga tem conseqüências danosas para a polinização. Sem ela, muitas plantas que ali vivem há milhões de anos, deixam de existir.
Os animais que se alimentam destes insetos, ou dessas plantas, morrem ou vão embora com eles. Também se poderia dizer que, sem árvores, as aves partem. Sem estas predadoras naturais, as pragas aumentam. O crescimento das pragas traz o agrotóxico. O solo pobre também traz a necessidade do fertilizante. E, com eles, a química dos laboratórios chega ao campo. Depois, à nossa mesa.
O calor e a crescente evaporação do solo desnudo, também matam bactérias produtoras de compostos essenciais à fertilidade da terra. Como elas, morrem fungos que vivem em associações benéficas com algumas plantas, nematóides, minhocas e outras formas de vida que compõem uma fauna pouco festejada, mas fundamental para a riqueza do subsolo.
O resultado não é só uma paisagem desoladora. O resultado é proporcional a um cataclisma local. Ali, o equilíbrio jamais será o mesmo.
Mas, por que se desmata tanto?
O Norte e o Noroeste do Paraná desmataram para plantar café. O café acabou. Hoje, o Norte tira o que resta para o plantio da cana. O Noroeste, para colocar o gado e, nos últimos dois anos, para a soja. Também para ceder à soja e ao trigo, caem as árvores dos Campos Gerais. O Centro-Sul desmata para dar lugar à madeira, que já é o segundo item em exportações do Estado. O Oeste e o sudoeste desmataram para a agricultura. A Floresta Atlântica, rasgada pela especulação imobiliária, pelos palmiteiros e madeireiros, cambaleante, ainda resiste. No Sul, também última região significativa, os setores madeireiro e do agronegócio bradam literalmente por seus direitos de poderem desmatar.
O capital avança sobre o mundo natural. A madeira é matéria prima e a terra é meio de produção. A natureza, assim, é apenas mercadoria. Onde entra a agricultura, sai a floresta. Também pagamos um alto preço por sermos o Estado campeão na produção de grãos.
No próximo Dia da Árvore por pouco não teremos que fazer uma homenagem póstuma ao pinheiro-do-paraná. Então, é preciso dizer o que é necessário fazer para reverter esse quadro quase desolador.
Primeiro, é necessário admitir que, dentre os inúmeros problemas ambientais que temos, a falta de cobertura vegetal (por suas graves implicações) de longe é nossa principal questão ambiental. Ou seja, a prioridade é essa.
Segundo, alterar este quadro é tarefa do Governo e da sociedade. Nem um, nem outro, sozinhos, chegam a lugar algum.
Só para se dar um exemplo, o Governo estadual e mais de 40 entidades e instituições da sociedade, iniciaram um gigantesco programa de recomposição de Matas Ciliares.
Em pouco tempo se pretende arborizar, com espécies nativas, mais de 100.000 km de rios paranaenses. É o programa de recomposição florestal mais ambicioso que se tem notícia e deverá cobrir cerca de 1 milhão de hectares. Só o Governo estadual estará investindo mais de 50 milhões de Reais, além de seus técnicos, veículos, máquinas, combustíveis e outros necessários reforços.
Terceiro, é preciso combinar pressa e paciência. É urgente começar, mas é emergencial entender que a recomposição florestal é tarefa de décadas. Não pelo ato mecânico de se plantar e sim pela necessária adesão da população à tarefa de preservar. Ter de volta a cobertura vegetal que um dia possuímos ou se faz porque a população assim o deseja ou não se faz.
Assim no próximo Dia da Árvore teremos uma bela oportunidade para se celebrar isso. Dessa forma, a nossa bela araucária, nos seus mais de 200 milhões de anos de existência, reconhecerá que, no fundo, finalmente estamos começando a ter juízo.
Revista Eco 21, Ano XIV, Edição 92, Julho 2004. (www.eco21.com.br) – Luiz Eduardo Cheida