A ameaça de um desastre no abastecimento mundial de alimentos está afastada, pelo menos nesta mudança de século. Embora algumas regiões do planeta apresentem um quadro endêmico de fome, isto ocorre muito mais por problemas de distribuição de renda do que pela falta de alimentos. As diversas hipóteses de falta de alimentos provocadas pelo esgotamento dos recursos naturais, principalmente terra, e pelo crescimento populacional não se concretizaram pelo trabalho persistente na geração e adoção de tecnologias mais eficientes de produção, que permitiram multiplicar por algumas vezes a produtividade de grãos e frutas, e melhorar significativamente a taxa de conversão na produção de proteínas animais. Mesmo com o crescimento populacional projetado para as próximas décadas, as recentes descobertas científicas na área de biologia avançada permitem prever que a implementação de novas tecnologias possibilitará o aumento da oferta de alimentos, sua diversificação e redução de custos.
Mas que tipo de tecnologias ajudarão o agricultor a produzir mais e permitirão aumentar o acesso da sociedade a maior volume de alimentos e de melhor qualidade?
As tecnologias mais promissoras, capazes de modificar a natureza, estão relacionadas à biotecnologia, principalmente com a engenharia genética. Elas mudam as vantagens competitivas porque podem fazer com que uma determinada planta produza em uma área gelada ou em uma área seca como o Nordeste. Sua particularidade é a modificação de organismos vivos, plantas e animais, agregando características distintas das originais. São tecnologias que contribuem para o aumento da produtividade, redução de custos de produção e adequação de produtos às exigências dos consumidores e para a implantação de sistemas produtivos ambientalmente sustentáveis. Os ganhos a serem obtidos pela engenharia genética irão se concentrar no melhoramento genético de plantas e animais, nutrição e sanidade. Existem no mundo, atualmente, dezenas de variedades de alimentos transgênicos. As culturas mais contempladas são a soja, milho, algodão e canola. O Brasil já começa a realizar os primeiros experimentos nesta área, que promete grande contribuição na geração de alimentos.
Outro conjunto de tecnologias que prometem revolucionar a agricultura está relacionado à redução do risco, como perdas de recursos pelo uso inadequado de insumos e contaminação ambiental. Tecnologias acopladas à agricultura de precisão, por meio de sensoreamento remoto, permitem uma alocação ótima de insumos de acordo com as exigências das culturas e necessidades do solo. Máquinas sofisticadas podem reduzir as perdas nas colheitas para níveis insignificantes, poupando produtos anteriormente desperdiçados. Tecnologias de irrigação, com doses ótimas de água, eliminam o risco de perdas de safras, principalmente em regiões de clima seco, como é o nosso Nordeste.
O terceiro grupo de tecnologias promissoras está ligado à agregação de valor aos produtos agropecuários. São relacionadas com o processamento de alimentos, embalagem e qualidade. A própria biotecnologia moderna contribui por meio de novos processos agroindustriais, como produtos fermentados. A agregação de valor aos produtos primários aumenta a renda no campo, gera empregos e contribui para o desenvolvimento do interior do País.
O quarto grupo indica que o setor agropecuário será ainda favorecido com a aceleração do sistema de acesso e transmissão de informações. Tecnologias agropecuárias e informações de mercado começam a chegar em tempo real aos produtores rurais, permitindo racionalização nas culturas e criações, decisões rápidas quanto ao plantio de culturas e sua comercialização. A utilização da Internet, em poucos anos se tornará, nos mais remotos recantos do País uma ferramenta para obtenção de informações sobre pesquisas recentes ou orientações de técnicos. A fluidez das informações contribuirá para eliminar irracionalidade nos diferentes elos das cadeias produtivas, como intermediações desnecessárias; podendo trazer ganhos para os produtores, que passarão a comprar os insumos em melhores condições e a vender na hora certa a produção.
O Brasil têm recursos humanos capacitados para gerar as tecnologias que vão definir as vantagens competitivas da agricultura mundial. Também é capaz de competir em igualdade de condições com qualquer país, em qualquer área do negócio agrícola. Por isso, os investimentos em pesquisa precisam não apenas continuar, mas ser incrementados. Os países competidores no mercado de alimentos, ao mesmo tempo que cada vez mais investem em ciência, têm menor interesse em repassar tecnologias de ponta. O Brasil se credenciou como o País de maior competência na geração de tecnologia agropecuária para os trópicos e em praticamente todas as áreas vitais da produção agropecuária e florestal. Se isso faz com que o brasileiro fique tranqüilo quanto a nossa atual capacidade de gerar alimentos, deve também ser um estímulo ao incremento dos investimentos na busca de soluções para a alimentação de nossa população e de alternativas para ampliar as exportações.
Fonte: Alberto Duque Portugal – Diretor-Presidente da Embrapa