A utilização sustentável de recursos naturais, particularmente no caso de recursos pesqueiros é um desafio formidável que necessita ser encarado do ponto de vista, técnico, político, econômico e social. Os recursos pesqueiros podem ser utilizados economicamente pela pesca profissional e amadora ou esportiva. O Brasil é um dos poucos países em que a pesca profissional de águas interiores possui um valor econômico apreciável, particularmente na Amazônia e no Pantanal.
Do ponto de vista político, como conciliar os diferentes usos da terra com a manutenção e integridade do ambiente, particularmente para a maioria das espécies de valor econômico que necessitam dessa integridade para a manutenção dos seus ciclos de vida, já que são espécies migradoras e mostram uma interação muito grande entre cabeceira e planície de inundação. Ainda, sob esse aspecto, como conciliar a pesca profissional e esportiva coexistindo no mesmo sistema, de vez que a esportiva traz muito mais retorno econômico que a profissional, em termos de geração de emprego e de valor agregado ao peixe.
Do ponto de vista social, a situação da pesca profissional é bastante crítica, visto que os pescadores são pouco escolarizados, possuem baixa capacidade de associação e em muitos casos, são manobrados por aqueles que deveriam estar defendendo os seus interesses. Por necessidade de sobrevivência, qualquer morador de cidade ribeirinha, ao perder o emprego, torna-se um pescador em potencial e o controle do número de pescadores, para assegurar uma pesca sustentável, passa a ser impraticável. Alia-se a isso ainda o acesso a programas governamentais de apoio social, tipo segurança alimentar, onde muitos se cadastram para ter acesso a cestas básicas, por exemplo. Ainda, como a licença de pesca profissional é grátis, qualquer morador de beira de rio, acaba conseguindo a sua licença de pescador profissional e quando isso acontece, uma estimativa do número real de pescadores profissionais passa a não existir.
Como a pesca em ambientes naturais, seja profissional ou esportiva, é essencialmente extrativista, na medida em que outros usos da terra se intensificam (agricultura, pecuária, mineração, etc.), há uma gradativa perda de qualidade ambiental, ao menos no Brasil, o que afeta tremendamente o potencial de reposição ou capacidade de suporte do sistema, chegando em muitos casos, a ser responsabilidade exclusiva dos pescadores, a redução dos estoques pesqueiros de um dado ambiente. Dessa forma, temos muitas vezes interpretações equivocadas dos reais motivos da redução dos estoques pesqueiros e uma demanda por parte de governantes para o fechamento das atividades de pesca, seja profissional ou esportiva.
Uma das formas de democratizar as decisões quanto ao uso sustentável e manutenção das atividades de pesca é a existência de um órgão colegiado onde os conflitos de interesse possam ser resolvidos, sempre ouvidos os argumentos técnico-científicos.
Por Emiko Kawakami de Resende (emiiko@cpap.embrapa.br) – doutora em ciências, pesquisadora e Chefe Geral da Embrapa Pantanal.