{"id":91,"date":"2009-02-09T12:02:28","date_gmt":"2009-02-09T12:02:28","guid":{"rendered":""},"modified":"2021-07-10T20:32:31","modified_gmt":"2021-07-10T23:32:31","slug":"riqueza_e_miseria_da_agua","status":"publish","type":"post","link":"http:\/\/localhost\/agua\/artigos_agua_doce\/riqueza_e_miseria_da_agua.html","title":{"rendered":"Riqueza e mis\u00e9ria da \u00e1gua"},"content":{"rendered":"\n
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Pa\u00eds que conta com a maior reserva de \u00e1gua doce do Planeta – algo em torno de 12% do volume mundial – \u00e9 surpreendente que o Brasil ainda ostente, ao lado dos sem-terra, milh\u00f5es de pessoas sem-\u00e1gua. A muitos negamos \u00e1gua por ser o recurso literalmente escasso (sert\u00e3o nordestino), conseq\u00fc\u00eancia de mal\u00e9fica combina\u00e7\u00e3o de for\u00e7as da natureza e de interven\u00e7\u00f5es antr\u00f3picas que levam ao desmatamento. A outros recusamos \u00e1gua porque, mesmo abundante, n\u00e3o investimos o necess\u00e1rio em saneamento, para lev\u00e1-la aos consumidores, em condi\u00e7\u00f5es adequadas de potabilidade. <\/p>\n\n\n\n

Quando nos referimos \u00e0 fome no Brasil, sempre nos perguntamos: por que, com tanta produ\u00e7\u00e3o agr\u00edcola e exporta\u00e7\u00e3o de gr\u00e3os? Na mesma linha, \u00e9 hora de come\u00e7armos a questionar a sede em um pa\u00eds com tamanha fartura de \u00e1gua, bem como o estado terminal de alguns dos nossos mais importantes rios, como o S\u00e3o Francisco e o Tiet\u00ea, para citar apenas dois deles. <\/p>\n\n\n\n

A \u00e1gua n\u00e3o s\u00f3 \u00e9 essencial \u00e0 sobreviv\u00eancia dos seres humanos, como, entre n\u00f3s, gera milh\u00f5es de empregos, na agricultura irrigada, na produ\u00e7\u00e3o de energia e em v\u00e1rias outras atividades produtivas. Diante de algo t\u00e3o precioso, dorsal \u00e0 vida econ\u00f4mica e social, seria de se esperar que a \u00e1gua estivesse no centro das decis\u00f5es governamentais, em todas as esferas da administra\u00e7\u00e3o. Infelizmente, n\u00e3o est\u00e1! <\/p>\n\n\n\n

\u00c9 certo que se avan\u00e7ou muito nos \u00faltimos anos, com a promulga\u00e7\u00e3o, em 1997, da Lei de Recursos H\u00eddricos (LRH), e com a cria\u00e7\u00e3o, em 2000, da Ag\u00eancia Nacional de \u00c1guas (ANA). O problema, entretanto, n\u00e3o \u00e9 legal, mas na implementa\u00e7\u00e3o da Lei, agravado por um di\u00e1logo reticente entre as pol\u00edticas de recursos h\u00eddricos, de saneamento e de meio ambiente. <\/p>\n\n\n\n

No campo da aplica\u00e7\u00e3o da LRH, h\u00e1 um ineg\u00e1vel vazio entre o que pretendeu o legislador e o que de fato vem ocorrendo na maioria das bacias hidrogr\u00e1ficas brasileiras. <\/p>\n\n\n\n

Na cobran\u00e7a pelo uso da \u00e1gua e na instala\u00e7\u00e3o de Comit\u00eas de Bacias, dois dos principais instrumentos da legisla\u00e7\u00e3o, s\u00f3 agora estamos dando, com muita oposi\u00e7\u00e3o, os primeiros passos. \u00c9 incompreens\u00edvel a resist\u00eancia do setor produtivo \u00e0 cobran\u00e7a por um recurso que n\u00e3o \u00e9 de dom\u00ednio privado, mas que, por pertencer \u00e0 coletividade, deve beneficiar a todos. Tampouco se justifica que expressivas Bacias do territ\u00f3rio nacional ainda n\u00e3o tenham seus Comit\u00eas. Ou que, pior, se instalados, n\u00e3o funcionem adequadamente ou agreguem uma participa\u00e7\u00e3o da sociedade civil que \u00e9 apenas protocolar. <\/p>\n\n\n\n

Em todos os casos, n\u00e3o \u00e9 desprez\u00edvel o risco de captura e coopta\u00e7\u00e3o da inst\u00e2ncia decis\u00f3ria pelos megaconsumidores, o que, a ocorrer, desmoralizar\u00e1 todo o sistema institucional democr\u00e1tico e participativo imaginado pela LRH. <\/p>\n\n\n\n

Mas \u00e9 no di\u00e1logo com a legisla\u00e7\u00e3o ambiental que mais se destacam os desafios de quem pretende salvaguardar os preciosos recursos h\u00eddricos brasileiros. At\u00e9 o leigo sabe que, sem a manuten\u00e7\u00e3o da cobertura florestal, os rios definham e, em dado momento, sofrem danos irrevers\u00edveis. <\/p>\n\n\n\n

A vitalidade dos cursos de \u00e1gua depende, diretamente, do regime legal que resguarda as suas nascentes, matas ciliares e outras \u00e1reas de preserva\u00e7\u00e3o permanente. <\/p>\n\n\n\n

Como viabilizar tal prote\u00e7\u00e3o dos espa\u00e7os verdes, genu\u00edna maternidade dos rios? S\u00e3o variados os mecanismos, tanto pol\u00edtico-jur\u00eddicos, como econ\u00f4micos, atualmente adotados em todo o mundo. Todos, contudo, demandam um marco regulat\u00f3rio claro, est\u00e1vel e implement\u00e1vel. <\/p>\n\n\n\n

Ora, \u00e9 exatamente o que nos falta hoje no Brasil, pois o principal da mat\u00e9ria florestal continua regrado por medida provis\u00f3ria, que, no limbo parlamentar, n\u00e3o tem qualquer data prevista para a sua vota\u00e7\u00e3o pelo Congresso Nacional. <\/p>\n\n\n\n

Certamente, poucos propriet\u00e1rios aceitar\u00e3o cumprir uma norma que n\u00e3o \u00e9 definitiva, nem mesmo no nome. \u00c0 falta de um marco regulat\u00f3rio que lhes assegure seguran\u00e7a para investir, em longo prazo, em medidas de recupera\u00e7\u00e3o de suas \u00e1reas de preserva\u00e7\u00e3o permanente e reserva legal, melhor esperar por tempos melhores, continuando tudo como est\u00e1, inclusive o crescente desmatamento. <\/p>\n\n\n\n

No di\u00e1logo das agendas, o Conselho Nacional do Meio Ambiental (CONAMA) joga um papel central. Neste momento, s\u00e3o poderosas as press\u00f5es para que se flexibilizem as regras de controle da polui\u00e7\u00e3o das \u00e1guas e de prote\u00e7\u00e3o contra a eros\u00e3o de \u00e1reas inclinadas, em particular topo e encosta de morros. <\/p>\n\n\n\n

Ser\u00e1 dif\u00edcil explicar \u00e0 na\u00e7\u00e3o que padr\u00f5es obrigat\u00f3rios para subst\u00e2ncias t\u00f3xicas e perigosas, editados em 1986, com o intuito de resguardar a sa\u00fade de todos, mais ainda de crian\u00e7as e idosos, sejam afrouxados em favor dos poluidores. Ou que, em regi\u00f5es de montanhas e morros, se libere a planta\u00e7\u00e3o de eucalipto, abrindo-se m\u00e3o da recupera\u00e7\u00e3o com esp\u00e9cies nativas, que melhor combatem a eros\u00e3o e asseguram a boa qualidade dos mananciais, em favor do plantio de esp\u00e9cies ex\u00f3ticas para fins industriais. <\/p>\n\n\n\n

Como lembrou o Papa Jo\u00e3o Paulo II, na sua mensagem por ocasi\u00e3o do lan\u00e7amento oficial da Campanha da Fraternidade de 2004, \u2018’a \u00e1gua n\u00e3o \u00e9 um recurso ilimitado”, sendo, por isso mesmo, dever de todos garantir que \u2018’permanecer\u00e1, de fato, fonte abundante de vida para todos”. <\/p>\n\n\n\n

Na esteira do pensamento do Santo Padre, no Dia Mundial da \u00c1gua, mais uma vez devemos renovar nosso compromisso com as presentes e futuras gera\u00e7\u00f5es. A estas n\u00e3o queremos deixar rios mortos ou enfermos, mas propiciar-lhes o benef\u00edcio pleno do bem mais precioso que a natureza nos concedeu. N\u00e3o \u00e9 pouco, considerando-se a tradi\u00e7\u00e3o brasileira de desprezo para com a \u00e1gua.<\/p>\n\n\n\n

Por Jos\u00e9 Sarney Filho – Deputado Federal (PV-MA), ex-Ministro do Meio Ambiente
\nFonte: Eco 21 – www.eco21.com.br<\/em><\/p>\n","protected":false},"excerpt":{"rendered":"