{"id":616,"date":"2008-12-19T10:40:06","date_gmt":"2008-12-19T10:40:06","guid":{"rendered":""},"modified":"2021-07-10T20:35:47","modified_gmt":"2021-07-10T23:35:47","slug":"biopirataria","status":"publish","type":"post","link":"http:\/\/localhost\/biotecnologia\/artigos_de_biotecnologia\/biopirataria.html","title":{"rendered":"Biopirataria"},"content":{"rendered":"\n
\"a\"\/<\/figure>\n\n\n\n

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Os tr\u00f3picos s\u00e3o o suporte da diversidade biol\u00f3gica do planeta por sua incompar\u00e1vel multiplicidade de ecossistemas. E a maioria dos pa\u00edses do Terceiro Mundo est\u00e1 situada precisamente nos tr\u00f3picos. Mas, a diversidade biol\u00f3gica enfrenta um processo de r\u00e1pida destrui\u00e7\u00e3o, devido, entre outras coisas, a megaprojetos financiados internacionalmente, como a constru\u00e7\u00e3o de represas, diques e rodovias, a explora\u00e7\u00e3o de minas ou a cria\u00e7\u00e3o de empreendimentos destinados \u00e0 piscicultura. Tamb\u00e9m tem sua parte a ofensiva tecnol\u00f3gica e econ\u00f4mica para substituir a diversidade pela homogeneidade na silvicultura, agricultura, pesca e cria\u00e7\u00e3o de animais.<\/p>\n\n\n\n

 A biodiversidade \u00e9 um recurso das pessoas. Enquanto o mundo industrializado e as sociedades ricas voltam as costas para a biodiversidade, os pobres no Terceiro Mundo continuam dependendo dos recursos biol\u00f3gicos para sua alimenta\u00e7\u00e3o e nutri\u00e7\u00e3o, para o cuidado com a sa\u00fade, para a energia, vestimenta e moradia. A biodiversidade n\u00e3o \u00e9, como a atmosfera ou os oceanos, um bem comum no sentido ecol\u00f3gico. Ela existe em pa\u00edses espec\u00edficos e \u00e9 usada por comunidades particulares. \u00c9 global apenas em seu papel de mat\u00e9ria-prima para as corpora\u00e7\u00f5es multinacionais.<\/p>\n\n\n\n

A biopirataria \u00e9 o desvio ilegal das riquezas naturais (flora, \u00e1guas e fauna) e do conhecimento das popula\u00e7\u00f5es tradicionais sobre a utiliza\u00e7\u00e3o dos mesmos. \u00c9 um mal que abate e enfraquece cada vez mais o nosso pa\u00eds e que termina ignorando sua soberania territorial, incluindo-se a perda de um imprescind\u00edvel patrim\u00f4nio gen\u00e9tico e biosf\u00e9rico, ainda longe de ser mensur\u00e1vel do ponto de vista econ\u00f4mico, mas que j\u00e1 \u00e9 explorado pela gan\u00e2ncia internacional.<\/p>\n\n\n\n

Assim, a biodiversidade passa de um bem comum local para uma propriedade privada cercada e fechada. De fato, o cercado dos bens comuns \u00e9 o objetivo dos direitos de propriedade intelectual e est\u00e1 sendo universalizado por meio dos tratados sobre Aspectos dos Direitos de Propriedade Intelectual relacionados com o Com\u00e9rcio, da Organiza\u00e7\u00e3o Mundial do Com\u00e9rcio (OMC), e de certas interpreta\u00e7\u00f5es da Conven\u00e7\u00e3o sobre Biodiversidade.<\/p>\n\n\n\n

Em v\u00e1rias regi\u00f5es da Amaz\u00f4nia, pesquisadores estrangeiros desembarcam com vistos de turista, entram na floresta, muitas vezes, infiltrando-se em comunidades tradicionais ou em \u00e1reas ind\u00edgenas. Estudam diferentes esp\u00e9cies vegetais ou animais com interesse para as ind\u00fastrias de rem\u00e9dios ou de cosm\u00e9ticos, coletam exemplares e descobrem, com o aux\u00edlio dos povos habitantes da floresta, seus usos a aplica\u00e7\u00f5es. Ap\u00f3s obterem informa\u00e7\u00f5es valiosas, voltam para seus pa\u00edses e utilizam as esp\u00e9cies e os conhecimentos das popula\u00e7\u00f5es nativas para isolarem os princ\u00edpios ativos.<\/p>\n\n\n\n

Ao ser descoberto o princ\u00edpio ativo, registram uma patente, que lhes d\u00e1 o direito de receber um valor a cada vez que aquele produto for comercializado. Vendem o produto para o mundo todo e at\u00e9 mesmo para o pr\u00f3prio pa\u00eds de origem, cujas comunidades tradicionais j\u00e1 tinham o conhecimento da sua utiliza\u00e7\u00e3o.<\/p>\n\n\n\n

No Estado do Amap\u00e1 existe uma Lei Estadual de Prote\u00e7\u00e3o e Acesso \u00e0 Biodiversidade do Amap\u00e1, a Lei 0388\/97. A lei disciplina o acesso aos recursos naturais do Estado, controlando toda e qualquer pesquisa sobre os recursos naturais no Amap\u00e1.<\/p>\n\n\n\n

Os estados brasileiros que mais exportam plantas medicinais s\u00e3o: Paran\u00e1, Bahia, Maranh\u00e3o, Amazonas, Par\u00e1 e Mato Grosso. Dentre as esp\u00e9cies mais procuradas est\u00e3o o cumaru, o guaran\u00e1, a ipecacuanha, o barbatim\u00e3o, o ip\u00ea-roxo, a espinheira-santa, a faveira, a carqueja, o absinto selvagem, a babosa. Algumas dessas esp\u00e9cies encontram-se amea\u00e7adas de extin\u00e7\u00e3o.<\/p>\n\n\n\n

Primordial na privatiza\u00e7\u00e3o da biodiversidade s\u00e3o a desvaloriza\u00e7\u00e3o do conhecimento ind\u00edgena, o deslocamento dos direitos locais e, simultaneamente, a cria\u00e7\u00e3o de direitos monopolizadores para o uso da biodiversidade atrav\u00e9s da reivindica\u00e7\u00e3o de supostas inova\u00e7\u00f5es introduzidas pelas transnacionais. As corpora\u00e7\u00f5es est\u00e3o usando os direitos de propriedade intlectual para piratear o conhecimento ind\u00edgena e a biodiversidade das comunidades do Terceiro Mundo. A biodiversidade \u00e9 o capital natural das pessoas pobres e a personifica\u00e7\u00e3o da diversidade cultural. Deve continuar sendo livre para que as sociedades sejam livres.<\/p>\n\n\n\n

Fazendo-se valer da car\u00eancia social e econ\u00f4mica dos mateiros, \u00edndios e matutos – gente que conhece como a palma da m\u00e3o os mist\u00e9rios e riquezas da natureza – buscam e orientam a explora\u00e7\u00e3o e o tr\u00e1fico de mudas, sementes, insetos e toda a sorte de interesses em nossa farta biodiversidade.<\/p>\n\n\n\n

Um, dos muitos fatores, que torna mais grave esta delicad\u00edssima quest\u00e3o da biopirataria no Brasil \u00e9 o crescente avan\u00e7o da biotecnologia no primeiro mundo ante um pa\u00eds que continua fazendo acanhados e parcos investimentos nos setores de educa\u00e7\u00e3o, ensino e pesquisa.<\/p>\n\n\n\n

O estudo do tema da biopirataria no Brasil permite dois grandes enfoques que s\u00e3o complementares. Um diz respeito \u00e0s a\u00e7\u00f5es clandestinas de retirada de recursos de nossa biodiversidade. Em geral associa-se esses atos \u00e0 pilhagem promovida no contato direto com comunidades que det\u00eam conhecimento original sobre propriedades de plantas ou animais.<\/p>\n\n\n\n

O segundo enfoque traz \u00e0 tona outra faceta da biopirataria, repleta de ambig\u00fcidades e zonas de sombras, relacionada \u00e0 maneira pela qual o Brasil, por meio de seus poderes p\u00fablicos, tem tratado a quest\u00e3o da regula\u00e7\u00e3o do acesso \u00e0 biodiversidade. Esse enfoque ajuda a entender embates que se d\u00e3o principalmente nos planos pol\u00edtico e institucional, caracterizando subtra\u00e7\u00f5es e preju\u00edzos ao patrim\u00f4nio gen\u00e9tico do pa\u00eds, muitas vezes sob abrigo oficial ou oficioso.<\/p>\n\n\n\n

Quando a Rio 92 aprovou a Conven\u00e7\u00e3o sobre Diversidade Biol\u00f3gica, estabeleceu-se um marco no reconhecimento do car\u00e1ter estrat\u00e9gico dos recursos de biodiversidade e da necessidade de regular o seu uso, para o bem da humanidade e benef\u00edcio de cada na\u00e7\u00e3o detentora. O Brasil deveria, a partir da\u00ed, ter o maior interesse em elaborar a legisla\u00e7\u00e3o nacional sobre o assunto, dada sua privilegiada biodiversidade. Al\u00e9m disso \u00e9 historicamente biopirateado e uma lei adequada seria o primeiro passo para estancar a sangria.<\/p>\n\n\n\n

Assim, a biopirataria n\u00e3o \u00e9 hoje fruto apenas da falta de fiscaliza\u00e7\u00e3o e de legisla\u00e7\u00e3o. Ela resulta tamb\u00e9m de uma postura equivocada do atual governo sobre a utiliza\u00e7\u00e3o e conserva\u00e7\u00e3o do gigantesco patrim\u00f4nio natural do pa\u00eds – como florestas, \u00e1gua e solo – impedindo que a sociedade brasileira fa\u00e7a dele alavanca eficaz para um desenvolvimento que proporcione gera\u00e7\u00e3o de emprego, renda e melhoria da qualidade de vida para todos.<\/p>\n\n\n\n

Alguns lembretes:<\/p>\n\n\n\n

– a retirada ilegal de madeira e produtos da floresta para fins comerciais \u00e9 um crime previsto na Lei de n\u00famero 9.605\/98, de crimes ambientais.<\/p>\n\n\n\n

– os produtos amaz\u00f4nicos com reconhecido poder medicinal mais procurados pelos piratas da floresta s\u00e3o a casca da Jatob\u00e1, casca do Ip\u00ea-roxo, folha da pata-de-vaca, cip\u00f3 da unha- de-gato, casca da canel\u00e3o e da catuaba. De acordo com estudos realizados por pesquisadores brasileiros foram identificadas 105 esp\u00e9cies medicinais, que est\u00e3o entre as mais visadas na Amaz\u00f4nia.<\/p>\n\n\n\n

– no mercado mundial de medicamentos (US$ 320 bilh\u00f5es anuais), 40% dos rem\u00e9dios s\u00e3o oriundos direta ou indiretamente de fontes naturais (30% de origem vegetal e 10% de animal). Estima-se que 25 mil esp\u00e9cies de plantas sejam usadas para a produ\u00e7\u00e3o de medicamentos.<\/p>\n\n\n\n

Este texto foi baseado nos seguintes autores:
\n* Janete Capiberibe
\n* Marcelo Baglione
\n* Marina Silva
\n* Vandana Shiva<\/em><\/p>\n","protected":false},"excerpt":{"rendered":"

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