{"id":2188,"date":"2009-01-09T10:07:30","date_gmt":"2009-01-09T10:07:30","guid":{"rendered":""},"modified":"2021-07-10T20:35:18","modified_gmt":"2021-07-10T23:35:18","slug":"o_desafio_para_a_conservacao_da_mata_atlantica","status":"publish","type":"post","link":"http:\/\/localhost\/natural\/artigos\/o_desafio_para_a_conservacao_da_mata_atlantica.html","title":{"rendered":"O Desafio para a Conserva\u00e7\u00e3o da \u201cMata Atl\u00e2ntica\u201d"},"content":{"rendered":"\n
Sempre que sou questionado sobre um tema que cerca a \u201cMata Atl\u00e2ntica\u201d costumo retrucar, em primeiro lugar, que a Floresta Atl\u00e2ntica n\u00e3o \u00e9 mata, \u00e9 floresta, assim como a Amaz\u00f4nica que tem tal status na boca do povo. Em segundo, questiono eu, a que tipo de bioma o tema se refere? Pois a Floresta Atl\u00e2ntica em que mergulho a cada descida da Serra do Mar ou da Paranapiacaba, rumo a Curitiba, tem diferen\u00e7as t\u00e3o d\u00edspares da regi\u00e3o de Floresta de Arauc\u00e1ria em que nasci e maiores ainda com a regi\u00e3o de Floresta Estacional em que moro atualmente, que n\u00e3o h\u00e1 como colocar todas em um mesmo saco e definir que tudo isto faz parte de uma s\u00f3 \u201cMata Atl\u00e2ntica\u201d. N\u00e3o consigo engolir o Mapa de Biomas do Brasil, encomendado ao IBGE pelos Minist\u00e9rios do Meio Ambiente e do Planejamento, Or\u00e7amento e Gest\u00e3o, como uma ferramenta \u00fatil para efeitos de conserva\u00e7\u00e3o da biodiversidade, manejo e desenvolvimento do Pa\u00eds.<\/p>\n\n\n\n
Infelizmente, a generaliza\u00e7\u00e3o da nomenclatura \u00e9 uma das menores a que est\u00e3o sujeitas todas as diferentes regi\u00f5es fitoecol\u00f3gicas \u2013 que s\u00e3o os verdadeiros biomas \u2013 que comp\u00f5em o que o Decreto 750\/93 definiu, no grito, como Mata Atl\u00e2ntica.<\/p>\n\n\n\n
Mas, e na pr\u00e1tica? O que fazer dos \u00faltimos fragmentos de uma vegeta\u00e7\u00e3o que possui somente 7,3% de sua cobertura original? E ainda mais, sabendo-se que agrega a regi\u00e3o fitoecol\u00f3gica de maior biodiversidade no planeta, a verdadeira Floreta Atl\u00e2ntica (Floresta Ombr\u00f3fila Densa, IBGE 1992)? Os propriet\u00e1rios rurais e comunidades que dela dependem para sua sobreviv\u00eancia clamam pela libera\u00e7\u00e3o para o manejo e pela convers\u00e3o do excedente ao que exige o C\u00f3digo Florestal. A sociedade urbana quer a preserva\u00e7\u00e3o e sua restaura\u00e7\u00e3o.<\/p>\n\n\n\n
Para a preserva\u00e7\u00e3o ser\u00e1 criada, nos pr\u00f3ximos 2 anos, uma bateria de Unidades de Conserva\u00e7\u00e3o. S\u00f3 em Floresta de Arauc\u00e1ria ser\u00e3o oito, e dessas, apenas uma de uso sustent\u00e1vel. Est\u00e3o sendo prospectadas as \u00e1reas com maior representatividade e \u00e1reas melhor conservadas. Convenhamos, neste \u00e2mbito, que as desapropria\u00e7\u00f5es para institui\u00e7\u00e3o de UC’s jamais indenizaram os propriet\u00e1rios de forma justa, considerando o valor dos produtos que l\u00e1 est\u00e3o. Tamb\u00e9m pudera, pois s\u00f3 a \u00e1rea do futuro Parque Nacional das Arauc\u00e1rias que deve abranger o sul do Paran\u00e1 e o norte de Santa Catarina, esvaziaria os cofres p\u00fablicos da Uni\u00e3o numa s\u00f3 tacada. Convenhamos ainda que, somente 20% das UC’s de n\u00edvel federal possuem um conselho consultivo (Prote\u00e7\u00e3o Integral) ou deliberativo (uso sustent\u00e1vel) formado, conforme exige o sensacional SNUC na implementa\u00e7\u00e3o dos planos de manejo. Com estas considera\u00e7\u00f5es, n\u00e3o se acena grandes perspectivas em curto prazo para nossa lamentada mata, j\u00e1 que uma enxurrada de a\u00e7\u00f5es judiciais certamente se acumular\u00e3o nos tribunais antes de conhecermos qualquer plano de manejo para as \u00e1reas. Contudo, acredito no SNUC como uma \u00f3tima ferramenta de preserva\u00e7\u00e3o de \u00e1reas com alto valor biol\u00f3gico quando o tiramos do plano das id\u00e9ias.<\/p>\n\n\n\n
Para a restaura\u00e7\u00e3o, os \u00d3rg\u00e3os de Meio Ambiente est\u00e3o com uma verdadeira batata quente nas m\u00e3os. As exig\u00eancias de revegeta\u00e7\u00e3o e averba\u00e7\u00e3o das \u00e1reas de Reserva Legal acabam por banalizar ainda mais os famosos Termos de Ajustamento de Conduta (TAC’s), pois amontoam-se \u00e0s pilhas junto a toda burocracia governamental e, em campo, o que se nota \u00e9 uma ins\u00edpida brincadeira de plantar \u00e1rvores nativas, 1\/30 da \u00e1rea por ano. E o pior, uma brincadeira completamente descoordenada. Agrava-se a situa\u00e7\u00e3o com um esquema de CRF (cotas de reserva florestal) que mais parece uma colcha de retalhos, puxando pedacinhos daqui e averbando acol\u00e1, sem crit\u00e9rios em favor da conserva\u00e7\u00e3o dos biomas ou das bacias hidrogr\u00e1ficas.<\/p>\n\n\n\n
Olhando para o lado dos propriet\u00e1rios rurais que possuem suas reservas nativas ou at\u00e9 excedentes aos m\u00ednimos 20% exigidos al\u00e9m das \u00e1reas de preserva\u00e7\u00e3o permanente, as perspectivas de utiliza\u00e7\u00e3o comercial destas \u00e1reas se resumem \u00e0 colheita da erva mate e parcos projetos de manejo de palmito. Convers\u00e3o para uso n\u00e3o florestais? Nem pensar. Resta-lhes tamb\u00e9m o turismo ecol\u00f3gico, que requer m\u00e3o de obra especializada, infra-estrutura arrojada, belos cen\u00e1rios e uma boa vontade de levar preju\u00edzos vez ou outra. Se houvesse, ainda, a possibilidade do turismo de ca\u00e7a, que tem uma for\u00e7a de impulso internacional dezenas de vezes maior que o turismo ecol\u00f3gico, sem comentar os rendimentos. Mas aqui, a ca\u00e7a \u00e9 crime. Nos pa\u00edses de primeiro mundo, \u00e9 esporte, e rende anualmente uma pequena fortuna aos propriet\u00e1rios de, tamb\u00e9m pequenas, florestas na Inglaterra, por exemplo. Neste caso, o interesse em que a floresta se mantenha e melhore a cada ano, \u00e9 do propriet\u00e1rio e n\u00e3o da sociedade, n\u00e3o dos ambientalistas de carteirinha. S\u00f3 assim sua pequena fortuna anual estar\u00e1 garantida, e junto com ela sua safra de trigo, canola etc, sem depender dos bancos ingleses.<\/p>\n\n\n\n
Ora, se estamos tratando da regi\u00e3o com a maior biodiversidade do planeta, o \u201c Homo sapiens brasilis\u201d mais uma vez atesta sua incompet\u00eancia no uso dos recursos com os quais fomos privilegiados. A proibi\u00e7\u00e3o ao aproveitamento destas \u00e1reas para o manejo dos infind\u00e1veis produtos proporcionados nas florestas, reflete na indisponibilidade de modelos de desenvolvimento que busquem a sustentabilidade com base nesta riqueza natural. Como n\u00e3o se tem modelos, n\u00e3o \u00e9 poss\u00edvel aprovar nenhum plano de manejo que ofere\u00e7a padr\u00f5es m\u00ednimos de sustentabilidade e se fecha um c\u00edrculo vicioso onde todos saem perdendo. A floresta perde por n\u00e3o ser valorizada por quem a det\u00e9m e a sociedade perde a chance de se redimir da furiosa devasta\u00e7\u00e3o que empreendeu durante o s\u00e9culo XX, tentando, desta vez, achar o caminho certo.<\/p>\n\n\n\n
Sabe-se das limita\u00e7\u00f5es dos \u00faltimos fragmentos em fornecer produtos madeireiros, por exemplo. Mas \u00e9 exatamente a\u00ed em que a oportunidade se escancara em nossa porta. Esta \u00e9 a chance de nos especializarmos, tirar \u201cleite da pedra\u201d, pois, se fomos t\u00e3o competentes em plantar esp\u00e9cies de \u00e1rvores ex\u00f3ticas e faze-las aumentar em m\u00e9dia 25% seu incremento em menos de 30 anos, se j\u00e1 experimentamos com a transgenia florestal, de que seremos capazes com as florestas naturais do sul do Brasil em 50 anos? Jamais saberemos sem tentar.<\/p>\n\n\n\n
A \u00fanica sa\u00edda para a conserva\u00e7\u00e3o da pobre rica \u201cMata Atl\u00e2ntica\u201d \u00e9 o aproveitamento de seus produtos de forma economicamente vi\u00e1vel, ambientemente correta, socialmente ben\u00e9fica, conforme a Carta para o Desenvolvimento Sustent\u00e1vel de 1992. Somente com a valoriza\u00e7\u00e3o dos \u00faltimos remanescentes florestais e a implementa\u00e7\u00e3o de modelos produtivos que tomem em conta tais regras \u00e9 que vislumbro o Brasil chegar ao final do s\u00e9culo XXI com uma \u00e1rea florestal nativa maior do que os n\u00edveis atuais na \u201cMata Atl\u00e2ntica\u201d e ainda, de quebra, ser a refer\u00eancia mundial ao sonhado modelo de desenvolvimento sustent\u00e1vel.<\/p>\n\n\n\n
Flavio Guiera (31) \u00e9 Engenheiro Florestal, formado em 1996 pela UFPR. Atualmente coordena os processos de certifica\u00e7\u00e3o florestal FSC\/SmartWood, atrav\u00e9s do IMAFLORA, para empreendimentos de base florestal plantada.<\/em><\/p>\n","protected":false},"excerpt":{"rendered":" Sempre que sou questionado sobre um tema que cerca a \u201cMata Atl\u00e2ntica\u201d costumo retrucar, em primeiro lugar, que a Floresta Atl\u00e2ntica n\u00e3o \u00e9 mata, \u00e9 floresta, assim como a Amaz\u00f4nica que tem tal status na boca do povo. <\/a><\/p>\n<\/div>","protected":false},"author":2,"featured_media":0,"comment_status":"closed","ping_status":"closed","sticky":false,"template":"","format":"standard","meta":{"footnotes":""},"categories":[1519],"tags":[23,121,640],"_links":{"self":[{"href":"http:\/\/localhost\/wp-json\/wp\/v2\/posts\/2188"}],"collection":[{"href":"http:\/\/localhost\/wp-json\/wp\/v2\/posts"}],"about":[{"href":"http:\/\/localhost\/wp-json\/wp\/v2\/types\/post"}],"author":[{"embeddable":true,"href":"http:\/\/localhost\/wp-json\/wp\/v2\/users\/2"}],"replies":[{"embeddable":true,"href":"http:\/\/localhost\/wp-json\/wp\/v2\/comments?post=2188"}],"version-history":[{"count":1,"href":"http:\/\/localhost\/wp-json\/wp\/v2\/posts\/2188\/revisions"}],"predecessor-version":[{"id":5736,"href":"http:\/\/localhost\/wp-json\/wp\/v2\/posts\/2188\/revisions\/5736"}],"wp:attachment":[{"href":"http:\/\/localhost\/wp-json\/wp\/v2\/media?parent=2188"}],"wp:term":[{"taxonomy":"category","embeddable":true,"href":"http:\/\/localhost\/wp-json\/wp\/v2\/categories?post=2188"},{"taxonomy":"post_tag","embeddable":true,"href":"http:\/\/localhost\/wp-json\/wp\/v2\/tags?post=2188"}],"curies":[{"name":"wp","href":"https:\/\/api.w.org\/{rel}","templated":true}]}}