{"id":2028,"date":"2009-03-12T17:19:19","date_gmt":"2009-03-12T17:19:19","guid":{"rendered":""},"modified":"2021-07-10T20:14:28","modified_gmt":"2021-07-10T23:14:28","slug":"competitividade_e_tecnologias_limpas","status":"publish","type":"post","link":"http:\/\/localhost\/gestao\/sistema_de_gestao_ambiental\/competitividade_e_tecnologias_limpas.html","title":{"rendered":"Competitividade e Tecnologias Limpas"},"content":{"rendered":"\n
A grande vantagem das tecnologias \u201climpas\u201d est\u00e1 na possibilidade de reverter um custo em benef\u00edcio. Ou seja, o que seria antes tratado como um problema (gastos adicionais para evitar emiss\u00f5es ou para pagar compensa\u00e7\u00f5es, caso a redu\u00e7\u00e3o de emiss\u00f5es n\u00e3o seja t\u00e9cnica ou economicamente vi\u00e1vel) passa a ser uma vantagem (ganhos de rendimento ou produtividade). Trata-se, portanto, de uma das tais situa\u00e7\u00f5es win-win que entraram no nosso vocabul\u00e1rio recentemente, onde o ganho de competitividade ocorre concomitantemente ao ganho social.<\/p>\n\n\n\n
Mas uma pergunta acaba sempre incomodando: se a tecnologia limpa \u00e9 a mais desej\u00e1vel tanto para a empresa quanto para a comunidade, por que ela n\u00e3o \u00e9 adotada em larga escala? Por que a necessidade de programas espec\u00edficos para sua difus\u00e3o?<\/p>\n\n\n\n Existem v\u00e1rias respostas diferentes para essa pergunta. Antes de mais nada, \u00e9 fundamental lembrar que as estruturas produtivas s\u00e3o bastante heterog\u00eaneas, ainda mais no caso de pa\u00edses de industrializa\u00e7\u00e3o perif\u00e9rica ou tardia (como o Brasil). Essa heterogeneidade estrutural \u00e9 o resultado de desigualdades e desequil\u00edbrios entre os v\u00e1rios setores, que acentuam diferentes padr\u00f5es tecn\u00f3logicos. Exemplo claro disso est\u00e1 na gritante diferen\u00e7a entre algumas atividades do setor manufatureiro que exigem elevada incorpora\u00e7\u00e3o de tecnologia (a maioria dos bens de consumo dur\u00e1veis que incorporam inova\u00e7\u00f5es microeletr\u00f4nicas, por exemplo), com outras onde o dinamismo na incorpora\u00e7\u00e3o de tecnologia \u00e9 menos presente (como em v\u00e1rias \u00e1reas tradicionais do setor de bens de consumo de n\u00e3o-dur\u00e1veis). Al\u00e9m disso, percebe-se a coexist\u00eancia, no mesmo setor, de firmas bastante avan\u00e7adas tecnologicamente (como algumas empresas voltadas para a exporta\u00e7\u00e3o, ou filiais de transnacionais), que tentam acompanhar – ainda que defasadamente – o progresso t\u00e9cnico gerado nos pa\u00edses centrais, com empresas bastante atrasadas tecnologicamente, geralmente voltadas para atender o mercado interno (em particular, em \u00e1reas onde a qualidade do produto ainda n\u00e3o \u00e9 t\u00e3o importante para a concorr\u00eancia).<\/p>\n\n\n\n As oportunidades para a difus\u00e3o de tecnologias limpas variam, portanto, enormemente. Em setores onde a disparidade tecnol\u00f3gica entre as firmas componentes \u00e9 muito grande, existe um grande espa\u00e7o de avan\u00e7o simplesmente atrav\u00e9s da melhoria nas formas de produ\u00e7\u00e3o das empresas mais defasadas. Nesse caso, o papel da pol\u00edtica p\u00fablica \u00e9 facilitar a transfer\u00eancia dessas tecnologias, tanto atrav\u00e9s de difus\u00e3o (muitas vezes o problema est\u00e1 no desconhecimento de novas t\u00e9cnicas) como criando mecanismos de financiamento e outros incentivos ao aperfei\u00e7oamento tecnol\u00f3gico. Um exemplo ainda pouco explorado no Brasil refere-se ao uso de pol\u00edticas de compras do governo; nesse caso, pode-se estipular crit\u00e9rios m\u00ednimos de controle de produ\u00e7\u00e3o para que a empresa seja habilitada a participar de licita\u00e7\u00f5es p\u00fablicas, obten\u00e7\u00e3o de concess\u00f5es, etc.<\/p>\n\n\n\n Uma situa\u00e7\u00e3o mais complicada refere-se aos setores onde as possibilidade de \u201cganho-ganho\u201d s\u00e3o muito reduzidas. Ou ent\u00e3o, em setores onde o capital instalado \u00e9 relativamente recente, e a ado\u00e7\u00e3o de tecnologias \u201credutoras de custos\u201d exigiria investimentos pesados sobre um parque instalado que ainda n\u00e3o foi financeiramente depreciado. A situa\u00e7\u00e3o agrava-se quando a capacidade de financiamento da empresa \u00e9 menor, situa\u00e7\u00e3o t\u00edpica de pequenas e m\u00e9dias empresas: ainda que haja conhecimento de formas mais eficientes de produ\u00e7\u00e3o, as restri\u00e7\u00f5es de capital ou escala impedem a sua ado\u00e7\u00e3o, e o m\u00e1ximo que se consegue em termos de gest\u00e3o ambiental \u00e9 a ado\u00e7\u00e3o de controles de \u201cfim de tubo\u201d que s\u00f3 representam aumento nos custos de produ\u00e7\u00e3o (logo, menor competitividade).<\/p>\n\n\n\n Deve-se ter claro essa limita\u00e7\u00e3o: nem sempre a melhoria da qualidade ambiental poder\u00e1 ser redutora de custos. O papel do formulador de pol\u00edtica (tanto do governo quanto das associa\u00e7\u00f5es industriais) ser\u00e1 exatamente identificar tais situa\u00e7\u00f5es onde a perda de competitividade \u00e9 potencial, a fim de apresentar medidas compensat\u00f3rias.<\/p>\n\n\n\n Aproveito aqui para reproduzir um esquema elaborado por Chudnovsky et al. (1997) em um estudo sobre a ind\u00fastria argentina, onde as a\u00e7\u00f5es de gest\u00e3o ambiental a n\u00edvel empresarial s\u00e3o classificadas esquematicamente em tr\u00eas grupos:<\/p>\n\n\n\n <\/p>\n <\/p>\n<\/td> <\/p>\n <\/p>\n<\/td> Tratamento eficaz de efluentes l\u00edquidos, emiss\u00f5es atmosf\u00e9ricas e res\u00edduos s\u00f3lidos e semi-s\u00f3lidos.<\/strong><\/p>\n\n\n\n As circunst\u00e2ncias que levam \u00e0 ado\u00e7\u00e3o das tecnologias limpas e otimiza\u00e7\u00e3o de processos est\u00e3o normalmente associadas a ind\u00fastrias de processo cont\u00ednuo, onde a redu\u00e7\u00e3o de efluentes pode representar uma economia consider\u00e1vel de custos (menor desperd\u00edcio = maior lucro). Acho que o exemplo mais \u00f3bvio est\u00e1 no complexo sucroalcooleiro: o reaproveitamento da vinha\u00e7a transformou um enorme problema em uma solu\u00e7\u00e3o. Ainda no mesmo setor, a utiliza\u00e7\u00e3o do baga\u00e7o da cana como fonte de energia reduz o problema de res\u00edduos s\u00f3lidos (embora as formas convencionais de queima da biomassa possam gerar outros problemas, relacionados \u00e0 polui\u00e7\u00e3o atmosf\u00e9rica – uma \u00e1rea que tem merecido esfor\u00e7o de pesquisa \u00e9 exatamente a melhoria na efici\u00eancia energ\u00e9tica e redu\u00e7\u00e3o de emiss\u00f5es na queima de biomassa). Outros exemplos est\u00e3o no complexo papel e celulose, qu\u00edmica, metalurgia, etc.<\/p>\n\n\n\n Essas ind\u00fastrias j\u00e1 est\u00e3o acostumadas a enfatizar o componente tecnol\u00f3gico como elemento de competi\u00e7\u00e3o, havendo um c\u00edrculo \u201cvirtuoso\u201d entre efici\u00eancia produtiva, capacidade inovativa e controle da contamina\u00e7\u00e3o (Chudnovsky et al., 1997). Por outro lado, onde a capacidade inovativa foi pouco desenvolvida ou a possibilidade de reutiliza\u00e7\u00e3o do res\u00edduo \u00e9 pouco atrativa, o avan\u00e7o do controle ambiental tende a ser mais concentrado no \u201cfim de tubo\u201d. Pequenas e m\u00e9dias empresas podem levar desvantagens neste ponto, mas cabe ressaltar que n\u00e3o se trata apenas de um problema de tamanho da firma: uma estrutura organizacional pouco estimuladora de inova\u00e7\u00f5es induz a altera\u00e7\u00f5es apenas marginais (favorecendo estrat\u00e9gias de \u201cfim de tubo\u201d, que pouco alteram o perfil da produ\u00e7\u00e3o). Ou seja, a pr\u00e9-exist\u00eancia de um sistema de ado\u00e7\u00e3o de inova\u00e7\u00f5es (por motivos n\u00e3o-ambientais) certamente favorecer\u00e1 a difus\u00e3o de tecnologias limpas.<\/p>\n\n\n\n Muitas dessas transforma\u00e7\u00f5es est\u00e3o tamb\u00e9m associadas a press\u00f5es de demanda em alguns (mas longe de ser todos) mercados de exporta\u00e7\u00e3o e press\u00f5es governamentais. O fortalecimento das ag\u00eancias de controle ambiental \u00e9 crucial, em especial considerando a atual tend\u00eancia de ado\u00e7\u00e3o de instrumentos econ\u00f4micos na gest\u00e3o ambiental p\u00fablica. A ado\u00e7\u00e3o do princ\u00edpio do usu\u00e1rio\/poluidor-pagador atua nesse sentido: a maior competitividade passa a ser do mais \u201climpo\u201d ou \u201cpoupador\u201d. Por outro lado, a exist\u00eancia de mecanismos de difus\u00e3o de tecnologia (e, \u00e9 claro, de financiamento para a efetiva implementa\u00e7\u00e3o dessas tecnologias) s\u00e3o de mesma import\u00e2ncia: n\u00e3o basta penalizar os que atuam de forma inadequada; \u00e9 tamb\u00e9m preciso criar os instrumentos para que o empres\u00e1rio corrija a sua a\u00e7\u00e3o.<\/p>\n\n\n\n Por fim, um aspecto ainda pouco ressaltado mas que tende a crescer de import\u00e2ncia no futuro, \u00e9 a harmoniza\u00e7\u00e3o de normas ambientais nos processos de integra\u00e7\u00e3o econ\u00f4mica. Nossos parceiros de Mercosul tamb\u00e9m devem compartilhar os esfor\u00e7os de melhoria da gest\u00e3o ambiental, sob o risco de criarmos \u201csantu\u00e1rios\u201d de polui\u00e7\u00e3o nas regi\u00f5es onde o controle \u00e9 menos rigoroso, gerando um diferencial de competitividade \u201cesp\u00fario\u201d (beneficiando os produtores que menos investirem em controle de polui\u00e7\u00e3o nas situa\u00e7\u00f5es onde o ganho-ganho n\u00e3o \u00e9 poss\u00edvel).<\/p>\n\n\n\n Por isso, devemos evitar o falso dogma de que maior participa\u00e7\u00e3o empresarial na gest\u00e3o ambiental significa menor necessidade de a\u00e7\u00e3o p\u00fablica nessa \u00e1rea. Um mito frequentemente repetido, em especial dentro do credo liberal ortodoxo, \u00e9 o da \u201climpeza\u201d que a liberaliza\u00e7\u00e3o de importa\u00e7\u00f5es eventualmente traria para os produtores ineficientes, normalmente identificados como os mais poluidores. Segundo essa vis\u00e3o, n\u00e3o seria preciso nenhuma interven\u00e7\u00e3o de pol\u00edtica p\u00fablica: na medida em que a concorr\u00eancia internacional \u201cnaturalmente\u201d eliminasse os menos competitivos, o mercado estaria automaticamente reduzindo a polui\u00e7\u00e3o. Esse racioc\u00ednio, embora bastante difundido, \u00e9 falacioso: nada garante que o mercado, por si s\u00f3, ir\u00e1 eleger os mais eficientes do ponto de vista ambiental. Por tr\u00e1s dessa id\u00e9ia, retoma-se o princ\u00edpio de voltarmos a ser um pa\u00eds exportador de mercadorias intensivas em recursos naturais simplesmente porque hoje apresentamos maiores vantagens comparativas (est\u00e1ticas) nessas atividades. Desenvolvimento sustent\u00e1vel \u00e9 incompat\u00edvel com depend\u00eancia em recursos naturais, seja ela sob forma de exaust\u00e3o de recursos n\u00e3o-renov\u00e1veis ou de degrada\u00e7\u00e3o de recursos renov\u00e1veis.<\/p>\n\n\n\n Esse lembrete serve para alertar que, apesar dos avan\u00e7os em algumas atividades voltadas para mercados externos onde os consumidores s\u00e3o ambientalmente exigentes, nem toda exporta\u00e7\u00e3o \u00e9 gerada de maneira ambientalmente desej\u00e1vel. Mais: resultados emp\u00edricos das pesquisas que venho coordenando no Grupo de Economia do Meio Ambiente do Instituto de Economia mostram que, ao menos desde a d\u00e9cada de oitenta, a economia brasileira vem apresentando uma perigosa tend\u00eancia de especializa\u00e7\u00e3o na exporta\u00e7\u00e3o de produtos potencialmente poluidores (Young, 1998). Analisado sob uma perspectiva de ciclo de vida (atrav\u00e9s de t\u00e9cnicas de insumo-produto), o complexo exportador brasileiro apresentou consistentemente intensidades de emiss\u00e3o (i.e., emiss\u00e3o gerada por unidade de valor da produ\u00e7\u00e3o) maiores que a da m\u00e9dia da economia para uma s\u00e9rie de par\u00e2metros associados \u00e0 polui\u00e7\u00e3o do ar e da \u00e1gua. Isso indica que o Brasil inseriu-se na divis\u00e3o internacional do trabalho como especializado em atividades \u201csujas\u201d, ratificando o famigerado lema do \u201cvenham nos poluir\u201d.<\/p>\n\n\n\n (Esse e outros assunto correlatos ser\u00e3o abordados no Curso de Economia Ambiental oferecido pelo N\u00facleo Interdisciplinar de Estudos Ambientais e Desenvolvimento (NIEAD) do CCMN da UFRJ (www.niead.ufrj.br).<\/p>\n\n\n\n Carlos Eduardo Frickmann Young Em setores onde a disparidade tecnol\u00f3gica entre as firmas componentes \u00e9 muito grande, existe um grande espa\u00e7o de avan\u00e7o simplesmente atrav\u00e9s da melhoria nas formas de produ\u00e7\u00e3o das empresas mais defasadas. <\/a><\/p>\n<\/div>","protected":false},"author":2,"featured_media":2029,"comment_status":"closed","ping_status":"closed","sticky":false,"template":"","format":"standard","meta":{"footnotes":""},"categories":[1504],"tags":[491,512,536,513,88,263],"_links":{"self":[{"href":"http:\/\/localhost\/wp-json\/wp\/v2\/posts\/2028"}],"collection":[{"href":"http:\/\/localhost\/wp-json\/wp\/v2\/posts"}],"about":[{"href":"http:\/\/localhost\/wp-json\/wp\/v2\/types\/post"}],"author":[{"embeddable":true,"href":"http:\/\/localhost\/wp-json\/wp\/v2\/users\/2"}],"replies":[{"embeddable":true,"href":"http:\/\/localhost\/wp-json\/wp\/v2\/comments?post=2028"}],"version-history":[{"count":1,"href":"http:\/\/localhost\/wp-json\/wp\/v2\/posts\/2028\/revisions"}],"predecessor-version":[{"id":4554,"href":"http:\/\/localhost\/wp-json\/wp\/v2\/posts\/2028\/revisions\/4554"}],"wp:featuredmedia":[{"embeddable":true,"href":"http:\/\/localhost\/wp-json\/wp\/v2\/media\/2029"}],"wp:attachment":[{"href":"http:\/\/localhost\/wp-json\/wp\/v2\/media?parent=2028"}],"wp:term":[{"taxonomy":"category","embeddable":true,"href":"http:\/\/localhost\/wp-json\/wp\/v2\/categories?post=2028"},{"taxonomy":"post_tag","embeddable":true,"href":"http:\/\/localhost\/wp-json\/wp\/v2\/tags?post=2028"}],"curies":[{"name":"wp","href":"https:\/\/api.w.org\/{rel}","templated":true}]}}Uso de tecnologias “limpas”<\/strong><\/td> Otimiza\u00e7\u00e3o de processos<\/strong><\/td> Tratamento “fim de tubo”<\/strong><\/td><\/tr> \n \n
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\nProf. do Instituto de Economia\/UFRJ e Prof. do Curso de Economia Ambiental do NIEAD\/UFRJ<\/em><\/p>\n","protected":false},"excerpt":{"rendered":"