{"id":1970,"date":"2009-03-12T15:30:17","date_gmt":"2009-03-12T15:30:17","guid":{"rendered":""},"modified":"2021-07-10T20:14:47","modified_gmt":"2021-07-10T23:14:47","slug":"construindo_mercados_para_a_sustentabilidade","status":"publish","type":"post","link":"http:\/\/localhost\/gestao\/artigos\/construindo_mercados_para_a_sustentabilidade.html","title":{"rendered":"Construindo mercados para a sustentabilidade"},"content":{"rendered":"\n

O cap\u00edtulo da Agenda 21 voltado \u00e0 agricultura sustent\u00e1vel preconizava morat\u00f3ria para os Cerrados. N\u00e3o se tratava de menosprezar a import\u00e2ncia do Centro-Oeste na expans\u00e3o da cultura de gr\u00e3os nem de subestimar o papel estrat\u00e9gico das grandes \u00e1reas cultivadas para o abastecimento interno e para as exporta\u00e7\u00f5es brasileiras.<\/p>\n\n\n\n

Os estudos especializados mostravam, entretanto, que era poss\u00edvel aumentar a oferta no Centro-Oeste sem o sacrif\u00edcio do bioma dos Cerrados no Norte e no Nordeste do Pa\u00eds: o segredo estava nas t\u00e9cnicas que permitiriam substituir milh\u00f5es de hectares de pastagens degradadas por lavouras de gr\u00e3os e, sobretudo, de soja. Isso permitiria recuperar os solos, aumentar a produ\u00e7\u00e3o em Goi\u00e1s, Mato Grosso do Sul e Mato Grosso e, em tese, reduzir a press\u00e3o sobre novas \u00e1reas em regi\u00f5es mais distantes, como Maranh\u00e3o, Piau\u00ed ou Par\u00e1.<\/p>\n\n\n\n

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Treze anos ap\u00f3s a publica\u00e7\u00e3o da Agenda 21, imp\u00f5e-se uma constata\u00e7\u00e3o cujas conseq\u00fc\u00eancias v\u00e3o muito al\u00e9m do setor agr\u00edcola e se referem ao conflito entre crescimento econ\u00f4mico e sustentabilidade ambiental. Os Cerrados n\u00e3o foram poupados por nenhum tipo de morat\u00f3ria.<\/p>\n\n\n\n

Sua destrui\u00e7\u00e3o prossegue e os pr\u00f3prios fazendeiros que acabaram comprando \u00e1reas de pastagem para fazer lavouras no Centro-Oeste est\u00e3o entre os primeiros a abrir novas \u00e1reas, em regi\u00f5es distantes, para a\u00ed implantarem uma agricultura altamente especializada.<\/p>\n\n\n\n

Pior: nas \u00e1reas do Centro-Oeste em que as pastagens foram substitu\u00eddas por lavouras homog\u00eaneas houve imenso preju\u00edzo ambiental, para o qual chama a aten\u00e7\u00e3o a disserta\u00e7\u00e3o de mestrado de Rafael Feltran-Barbieri (\u201cCerrados sob Fazendas – Hist\u00f3ria Agr\u00e1ria do Dom\u00ednio dos Cerrados\u201d), defendida recentemente no Programa de P\u00f3s-Gradua\u00e7\u00e3o em Ci\u00eancia Ambiental da USP.<\/p>\n\n\n\n

O que sob o \u00e2ngulo produtivo se chama de pastagem degradada cont\u00e9m um importante manancial de biodiversidade animal e vegetal, bastante adaptado a formas tradicionais de cria\u00e7\u00e3o de gado. S\u00e3o fazendas cujos m\u00e9todos produtivos estimulam a manuten\u00e7\u00e3o de superf\u00edcies florestais e cujas pastagens preservam partes significativas do meio natural.<\/p>\n\n\n\n

Os agricultores que compram e exploram essas fazendas no Centro-Oeste – em geral eles v\u00eam do Sul do Pa\u00eds – recuperam as \u00e1reas degradadas, sob o \u00e2ngulo agron\u00f4mico.<\/p>\n\n\n\n

Mas essa recupera\u00e7\u00e3o elimina a biodiversidade ainda remanescente nos sistemas produtivos de pastagens. O balan\u00e7o entre a perda ambiental da\u00ed decorrente e o ganho produtivo trazido pela cultura entrante n\u00e3o \u00e9 f\u00e1cil de avaliar. H\u00e1, por\u00e9m, uma medida do impacto dessa ocupa\u00e7\u00e3o sobre as novas \u00e1reas de lavoura. E \u00e9 a\u00ed que os resultados s\u00e3o preocupantes.<\/p>\n\n\n\n

Rafael Feltran-Barbieri visitou 77 fazendas em dois munic\u00edpios goianos perto do Parque Nacional das Emas, em Goi\u00e1s. Entrevistou seus propriet\u00e1rios ou os respons\u00e1veis por sua gest\u00e3o.<\/p>\n\n\n\n

E o resultado \u00e9 estarrecedor: 88% dos fazendeiros desconsideram o C\u00f3digo Florestal e mais da metade desses n\u00e3o possui nem um \u00fanico metro quadrado de vegeta\u00e7\u00e3o nativa. O aumento produtivo apoiou-se na quase completa elimina\u00e7\u00e3o de qualquer vest\u00edgio da biodiversidade previamente existente.<\/p>\n\n\n\n

H\u00e1 duas solu\u00e7\u00f5es poss\u00edveis para esse desrespeito \u00e0 Lei: a primeira consiste em aumentar a fiscaliza\u00e7\u00e3o. Esta solu\u00e7\u00e3o parece razoavelmente eficiente em regi\u00f5es onde a agricultura \u00e9 pouco importante, como na Mata Atl\u00e2ntica de S\u00e3o Paulo. Mas seus resultados ser\u00e3o quase nulos em \u00e1reas de expans\u00e3o da fronteira agr\u00edcola.<\/p>\n\n\n\n

A segunda solu\u00e7\u00e3o passa pela maneira como os mercados s\u00e3o organizados. Hoje existem meios t\u00e9cnicos pouco onerosos pelos quais se podem obter, de maneira permanente, os mapas das propriedades agropecu\u00e1rias por fotografia de sat\u00e9lite extra\u00edda da Internet. Se as ind\u00fastrias condicionarem a compra do produto do agricultor \u00e0 certifica\u00e7\u00e3o de que este respeita o C\u00f3digo Florestal haver\u00e1 um tr\u00edplice ganho. A ind\u00fastria poder\u00e1 associar seus produtos a um rastreamento capaz de demonstrar a sustentabilidade ambiental de sua oferta.<\/p>\n\n\n\n

O Pa\u00eds preservar\u00e1 seus recursos naturais e os produtores ter\u00e3o na certifica\u00e7\u00e3o ambiental um fator de valoriza\u00e7\u00e3o da qualidade de suas pr\u00e1ticas. De certa forma, isso \u00e9 feito com o selo ABRINQ, que comprova a avers\u00e3o ao uso de trabalho infantil, e mesmo o selo ABIC, que garante ao consumidor a compra de caf\u00e9 de fato, e n\u00e3o de poeira torrada.<\/p>\n\n\n\n

Os custos de tal pol\u00edtica s\u00e3o surpreendentemente baixos tendo em vista os recursos tecnol\u00f3gicos atuais. E seria uma forma de os grandes compradores de produtos agr\u00edcolas poderem participar de um processo de planejamento pelo qual o Estado delimitaria novas \u00e1reas a serem ocupadas e faria cumprir as restri\u00e7\u00f5es ambientais necess\u00e1rias \u00e0 preserva\u00e7\u00e3o das superf\u00edcies atuais.<\/p>\n\n\n\n

\u00c9 imposs\u00edvel construir as institui\u00e7\u00f5es do desenvolvimento sustent\u00e1vel voltando as costas para o setor privado. Mas n\u00e3o se pode aceitar que a destrui\u00e7\u00e3o generalizada seja o mal necess\u00e1rio para o crescimento econ\u00f4mico. O rastreamento ambiental \u00e9 um caminho importante para reduzir o conflito entre expans\u00e3o produtiva e sustentabilidade. Parece pouco, mas num pa\u00eds como o Brasil representar\u00e1 um progresso fant\u00e1stico.<\/p>\n\n\n\n

por Ricardo Abramovay (Professor titular do Departamento de Economia e do Programa de P\u00f3s-Gradua\u00e7\u00e3o em Ci\u00eancia Ambiental da USP)<\/em><\/p>\n","protected":false},"excerpt":{"rendered":"

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