{"id":1787,"date":"2009-03-10T13:14:44","date_gmt":"2009-03-10T13:14:44","guid":{"rendered":""},"modified":"2021-07-10T20:15:02","modified_gmt":"2021-07-10T23:15:02","slug":"beneficios_do_programa_lba_para_a_ciencia_brasileira_e_a_amazonia","status":"publish","type":"post","link":"http:\/\/localhost\/florestal\/artigos\/beneficios_do_programa_lba_para_a_ciencia_brasileira_e_a_amazonia.html","title":{"rendered":"Benef\u00edcios do Programa LBA para a ci\u00eancia brasileira e a Amaz\u00f4nia"},"content":{"rendered":"\n

Cerca de 800 cientistas e especialistas vindos de mais de 70 centros de pesquisa do Brasil, bem como de outras 100 institui\u00e7\u00f5es internacionais dos pa\u00edses amaz\u00f4nicos, dos EUA e da Europa, entre as quais entidades com o prest\u00edgio da NASA, das Universidades de Harvard, da Calif\u00f3rnia e Cornell (EUA), do Instituto Max-Planck e da Universidade de Oxford (Europa), estar\u00e3o reunidos em Bras\u00edlia, para discutir os resultados de um dos maiores experimentos cient\u00edficos atualmente em andamento no mundo, proposto e liderado desde 1998 pelo Brasil: o LBA, ou Experimento de Grande Escala da Biosfera-Atmosfera na Amaz\u00f4nia. Planejado para terminar em 2006, o experimento LBA \u00e9 um sucesso cient\u00edfico internacional, com 61 projetos j\u00e1 conclu\u00eddos e 59 em andamento. O mais importante \u00e9 que se trata daquilo que \u00e9 informalmente chamado de \u201cci\u00eancia de ponta\u201d, isto \u00e9, pesquisa de alta qualidade e extremamente atualizada. Os trabalhos contam com mais de 1000 pesquisadores das institui\u00e7\u00f5es brasileiras, al\u00e9m dos organismos estrangeiros de pa\u00edses da Bacia Amaz\u00f4nica (Venezuela, Peru, Bol\u00edvia, Col\u00f4mbia e Equador) e das colabora\u00e7\u00f5es e interc\u00e2mbios com as institui\u00e7\u00f5es americanas e de oito pa\u00edses europeus. O programa como um todo \u00e9 caracterizado pela interdisciplinaridade.<\/p>\n\n\n\n

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A oportunidade \u00e9 hist\u00f3rica e estrat\u00e9gica para o Brasil. De fato, a import\u00e2ncia da Amaz\u00f4nia vai bem al\u00e9m do lugar-comum de louvar a maior floresta tropical remanescente no Planeta ou sua maior fonte de biodiversidade. Entre o que em geral n\u00e3o \u00e9 citado est\u00e1 o fato de a regi\u00e3o amaz\u00f4nica ser uma importante fonte continental de vapor d\u2019\u00e1gua da atmosfera, com um papel essencial na forma\u00e7\u00e3o de nuvens e na determina\u00e7\u00e3o do clima regional e at\u00e9 mesmo global. A floresta chega a fornecer grande parte do vapor d\u2019\u00e1gua que se transformar\u00e1 nas chuvas das regi\u00f5es Centro e Sudeste. Mas o panorama \u00e9 bem maior. Desde a Revolu\u00e7\u00e3o Industrial a atividade humana se tornou o principal fator de altera\u00e7\u00e3o da composi\u00e7\u00e3o da atmosfera. O caso do CO2 \u00e9 exemplar: principal respons\u00e1vel pelo Efeito Estufa, era encontrado no ar, at\u00e9 1850, \u00e0 propor\u00e7\u00e3o de 280 partes por milh\u00e3o (ppm). Hoje o CO2 chega \u00e0 casa das 370 ppm, e teme-se que beire 1000 ppm em 2100. Dados como esses podem se traduzir, na pr\u00e1tica, em grandes mudan\u00e7as clim\u00e1ticas e impactos s\u00f3cio-econ\u00f4mico-ambientais ainda maiores. Da\u00ed o valor de se medir (do ponto de vista financeiro e n\u00e3o-financeiro) os \u201cservi\u00e7os ambientais\u201d prestados pela floresta. Pesquisas do LBA colocam em debate, por exemplo, se a Amaz\u00f4nia \u00e9 uma fonte expressiva de carbono, devido aos desmatamentos ou mesmo um sumidouro do g\u00e1s (\u201climpando\u201d at\u00e9 cerca de 600 milh\u00f5es de toneladas de carbono da atmosfera por ano). Esse servi\u00e7o de \u201cfaxina\u201d atmosf\u00e9rica, por assim dizer, pode vir a valer muito num mundo que se preocupa muito (vide o Protocolo de Kyoto, da Conven\u00e7\u00e3o das Na\u00e7\u00f5es Unidas sobre Mudan\u00e7as Clim\u00e1ticas) em como mitigar as mudan\u00e7as clim\u00e1ticas. Tudo isso faz do Experimento de Grande Escala da Biosfera-Atmosfera na Amaz\u00f4nia – LBA um projeto priorit\u00e1rio, onde a abordagem cient\u00edfica busca relacionar os aspectos biol\u00f3gicos, f\u00edsicos, qu\u00edmicos e s\u00f3cio-econ\u00f4micos. Ele \u00e9 parte do esfor\u00e7o cient\u00edfico global para entender o papel de uma regi\u00e3o cr\u00edtica como a Amaz\u00f4nia contribui para as mudan\u00e7as clim\u00e1ticas e como ela responde a estas mudan\u00e7as. Seus modelos j\u00e1 demonstraram, por exemplo, o papel chave dos aeross\u00f3is (micro part\u00edculas emitidas pelas plantas, entre outras fontes como queimadas, ao redor das quais o vapor de \u00e1gua se condensa) na absor\u00e7\u00e3o e espalhamento da radia\u00e7\u00e3o solar, bem como na nuclea\u00e7\u00e3o (forma\u00e7\u00e3o) das nuvens e na queda das chuvas. Na Amaz\u00f4nia j\u00e1 \u00e9 poss\u00edvel falar, gra\u00e7as ao LBA, em v\u00e1rias quest\u00f5es importantes: o balan\u00e7o de carbono, a forma\u00e7\u00e3o de nuvens e chuvas, o ciclo de nutrientes das plantas e as conseq\u00fc\u00eancias das mudan\u00e7as dos usos da terra.<\/p>\n\n\n\n

A comprova\u00e7\u00e3o que os desflorestamentos e as queimadas n\u00e3o s\u00f3 aceleram o efeito estufa, como est\u00e3o diretamente relacionados a mudan\u00e7as dr\u00e1sticas na forma\u00e7\u00e3o de nuvens, o que pode diminuir os \u00edndices de queda de chuvas n\u00e3o apenas em vastas \u00e1reas da Amaz\u00f4nia como em outras partes do pa\u00eds (Centro Oeste, Sul e Sudeste), especialmente durante o final da esta\u00e7\u00e3o seca (\u00e9poca das queimadas:Agosto\/Outubro). A descoberta de que nas \u00e1reas queimadas as plantas custam a renascer, principalmente por falta de nitrog\u00eanio e n\u00e3o de f\u00f3sforo, como se pensava antes, pois o nitrog\u00eanio \u201cvai embora\u201d com a fuma\u00e7a (na Amaz\u00f4nia brasileira t\u00eam sido desmatados entre 20 e 25 mil km2\/ano de floresta nos \u00faltimos anos), aponta para uma poss\u00edvel forma de recupera\u00e7\u00e3o dessas \u00e1reas, com o uso de adubos altamente nitrogenados. A revela\u00e7\u00e3o que devido \u00e0 grande libera\u00e7\u00e3o do nitrog\u00eanio para o ar nas queimadas, as chuvas sobre \u00e1reas desflorestadas e sobre florestas preservadas s\u00e3o quimicamente diferentes: as primeiras trazem de volta o nitrog\u00eanio, em grandes quantidades, sob a forma de am\u00f4nia, enquanto as segundas trazem nitrog\u00eanio em quantidades menores na forma de nitrato, \u00fatil nutriente das plantas. A am\u00f4nia em algumas \u00e1reas degradadas da floresta chega a ser t\u00e3o grande como em cidades como Campinas ou Piracicaba, sendo que este elemento qu\u00edmico acidifica o solo e \u00e9 diretamente respons\u00e1vel pelas chamadas chuvas \u00e1cidas, cujos danos s\u00f3 s\u00e3o percept\u00edveis em 2 ou 3 d\u00e9cadas.<\/p>\n\n\n\n

Os cientistas j\u00e1 observaram que a fuma\u00e7a das queimadas, com sua desequilibrada emiss\u00e3o de aeross\u00f3is, chega, em algumas \u00e1reas da Amaz\u00f4nia, a reduzir a radia\u00e7\u00e3o solar dispon\u00edvel para fotoss\u00edntese das plantas em at\u00e9 60%, al\u00e9m de estimular a concentra\u00e7\u00e3o do oz\u00f4nio fitot\u00f3xico (em at\u00e9 100 partes por bilh\u00e3o) que \u00e9 prejudicial \u00e0s plantas e danifica a floresta ainda n\u00e3o queimada. A complexidade amaz\u00f4nica tornou-se mais \u201cvis\u00edvel\u201d com o LBA: sabe-se agora que o \u201cinferno verde\u201d n\u00e3o \u00e9 uma floresta uniforme, mas um mosaico de matas distintas que, entre outras caracter\u00edsticas, se desenvolvem em per\u00edodos diversos do ano (por exemplo, as plantas das \u00e1reas alagadas, que s\u00e3o 20% de toda a Amaz\u00f4nia, crescem mais na seca, o inverso do que ocorre nas \u00e1reas de terra firme), e que nascem, crescem e morrem tr\u00eas vezes mais r\u00e1pido no Oeste do continente (pr\u00f3ximo aos Andes) do que na \u00e1rea do Par\u00e1, pr\u00f3xima ao mar. A s\u00edntese dos v\u00e1rios estudos sobre o ciclo de carbono de \u00e1reas florestais preservadas n\u00e3o excluem a possibilidade concreta de que a floresta amaz\u00f4nica seja um sumidouro de excesso de g\u00e1s carbono da atmosfera.<\/p>\n\n\n\n

Estas s\u00e3o apenas algumas das quest\u00f5es que estar\u00e3o sendo examinadas em profundidade nesta III Confer\u00eancia. Os dados apresentados poder\u00e3o inclusive influenciar discuss\u00e3o e ado\u00e7\u00e3o de pol\u00edticas p\u00fablicas e de novas leis, que possam ajudar \u00e0 manuten\u00e7\u00e3o da estabilidade hidrol\u00f3gica, da qualidade das \u00e1guas, da biodiversidade e dos demais servi\u00e7os ambientais prestados pelos ecossistemas. Antes do in\u00edcio da Confer\u00eancia, os cientistas promover\u00e3o, para a classe pol\u00edtica e tomadores de decis\u00f5es estrat\u00e9gicas, a sess\u00e3o especial intitulada O Conhecimento Cient\u00edfico e a Formula\u00e7\u00e3o de Pol\u00edticas P\u00fablicas para a Amaz\u00f4nia: A Experi\u00eancia do Programa LBA.<\/p>\n\n\n\n

Uma das quest\u00f5es essenciais do LBA \u00e9 como conciliar a preserva\u00e7\u00e3o da natureza com as necessidades das popula\u00e7\u00f5es que vivem na regi\u00e3o. Afinal, na Amaz\u00f4nia vivem 24 milh\u00f5es de pessoas (no Brasil, Bol\u00edvia, Peru, Equador, Col\u00f4mbia e Venezuela), e toda a proposta de um desenvolvimento sustent\u00e1vel da regi\u00e3o que permita a evolu\u00e7\u00e3o social sem destruir o patrim\u00f4nio natural depende das respostas que os cientistas possam dar a partir de suas pesquisas.<\/p>\n\n\n\n

O LBA \u00e9 considerado o maior projeto supranacional de coopera\u00e7\u00e3o cient\u00edfica j\u00e1 criado na \u00e1rea ambiental: ele surgiu por meio de acordos internacionais e \u00e9 financiado pelas principais ag\u00eancias de fomento brasileiras (MCT, Fapesp, Embrapa, etc), pela NASA e pela Uni\u00e3o Europ\u00e9ia.<\/p>\n\n\n\n

Revista Eco 21, Ano XIV, Edi\u00e7\u00e3o 92, Julho 2004. (www.eco21.com.br) – Gloria Malavoglia
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